Distribuição de marmitas muda em SP e provoca críticas

Com a fila dando a volta em uma quadra do centro de São Paulo, o pedreiro Fábio de Lima, de 43 anos, esperava de braços cruzados sua vez de pegar o almoço. Ele já havia dobrado a última esquina, conseguido chegar à Rua José Bonifácio e estava a poucos metros de ser atendido, quando as marmitas para doação acabaram. “Na rua é assim. Uma hora você come, outra hora você não come.”

Voltado para moradores de rua, o ponto de distribuição de alimentos recebe apoio do programa Rede Cozinha Cidadã, da Prefeitura, que começou por causa da pandemia de covid-19 e agora está sob ameaça. Segundo organizadores, o número de marmitas disponíveis já diminuiu de 1 mil para 750 por dia. Quantidade que ontem se esgotou em exatos 19 minutos. Lima e pelo menos outras 60 pessoas da fila ficaram sem comer. Mulheres, transexuais e crianças são atendidas primeiro e não precisam ficar na fila.

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O cardápio é variado. No mesmo dia, pode ser servida sopa de atum, peito de frango e salsicha. No início da pandemia, o programa chegou a distribuir mais de 10 mil marmitas por dia. Os sucessivos cortes, no entanto, têm levado entidades que atuam com a população de rua a tomar medidas tanto no Judiciário quanto no Legislativo. Após a previsão de que o programa seria encerrado, o prefeito Ricardo Nunes (MDB) decidiu que irá mantê-lo ao menos até dezembro. Não especificou, porém, as condições da renovação.

Em nota, a Prefeitura informou que, “com a progressão do cenário pandêmico e o período atual de maior abertura em relação ao funcionamento do comércio”, está direcionando os beneficiários do Rede Cozinha Cidadã – que também paga R$ 10 a estabelecimentos parceiros por cada refeição distribuída para combater o desemprego – aos restaurantes Bom Prato, em uma parceria com a Secretaria de Estado de Desenvolvimento Social. Como parte dessa transição, foram fornecidos, segundo a Prefeitura, 4 mil cartões com QR Code, que já teriam sido distribuídos para dar gratuidade à população em situação de rua no Bom Prato.

Líderes de entidades, no entanto, temem que o número não atenda à demanda, além de citar outros fatores que poderiam dificultar a alimentação da população de rua, como a falta de capilaridade dos restaurantes do Bom Prato. O Movimento Estadual da População em Situação de Rua de São Paulo (MEPSRSP) solicitou ao Ministério Público do Estado e à Defensoria Pública que acionassem a Justiça contra o fim do programa da Prefeitura. Porém, em decisão liminar, o juiz Kenichi Koyama indeferiu o pedido, argumentando que o tema está na arena política e escapa ao controle jurídico.

O MP e a Defensoria recorreram e agora esperam novas definições, mas isso não impediu que o presidente do MEPSRSP, Robson Mendonça, tomasse uma medida mais drástica.”Só me restou uma coisa a fazer. Fui lá, comprei uma corrente, fui para a frente da Câmara Municipal, me acorrentei e fiquei solicitando uma reunião com o presidente da Câmara. Ia fazer greve de fome e tudo mais”, disse.

O episódio aconteceu por volta de 9h da última segunda-feira. Ele foi atendido por membros da Comissão de Direitos Humanos na quarta-feira, quando deixou o local. A previsão é de manter a oferta de refeições do programa, mas concentrando a distribuição em menos unidades. A Prefeitura não especificou quais seriam as condições da renovação e apontou o que, apesar de estar “em transição para manter a garantia de segurança alimentar na cidade em condições dignas”, o programa não foi interrompido “em momento algum”.

Dados de censo realizado em 2019 pela empresa Qualitest Ciência e Tecnologia Ltda, que inclusive são utilizados como parâmetro pela Prefeitura, contabilizaram 24.344 pessoas em situação de rua na cidade de São Paulo.

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