Para a economista e mestre em planejamento energético, Lúcia Navegantes Bicalho, o preço do botijão de 13 kg de GLP (Gás Liquefeito de Petróleo) popularmente conhecido como gás de cozinha, não tem sinais de que terá queda de preço. Na região o gás é encontrado de R$ 90 e R$ 100 valores muito elevados para a população de baixa renda.
Na nota técnica publicada na 18 ª Carta do Conjuscs (Observatório de Políticas Públicas, Empreendedorismo e Conjuntura da Universidade Municipal de São Caetano do Sul) Lúcia explica a evolução do preço do gás de cozinha desde os anos 50 até o momento atual. A nota mostra que o preço do botijão nos primeiros meses de 2020 se mantinha estável em torno de R$ 70 e com a pandemia já no segundo trimestre houve uma alta de 11,6% no consumo. “As famílias ficaram mais em casa, o home office fez com que mais refeições fossem feitas em casa e isso influenciou o mercado”, comentou a pesquisadora.
No último trimestre de 2020, segundo a nota técnica, os preços de revenda do botijão de GLP de 13 kg iniciaram uma trajetória de alta, passando do patamar de R$ 70 para R$ 74,75, o que representou um aumento de 6,8%. Em julho deste ano o botijão já custava R$ 91,92 preço 25% maior do que o de dezembro de 2020. A nota sustenta, que junto com outro derivado do petróleo, a gasolina, o gás fez o IPCA (Índice de Preços ao Consumidor Amplo) subir 4,76% de janeiro a julho.
A dificuldade das famílias de baixa renda conseguirem comprar o botijão de gás, fez com que entidades olhassem para esse problema. A Cufa (Central Única das Favelas) de São Bernardo, por exemplo, forneceu às famílias de baixa renda que atende, além de cestas básicas, também um botijão de gás. Algumas famílias ainda em maior dificuldade recorreram a fogões à lenha improvisados. O presidente da Cufa de São Bernardo, Alex Cambura, disse que as famílias mais carentes já estão improvisando formas de cozinhar sem o gás. “Eu já vi na favela da Paz famílias que construíram fogões a lenha por falta de condições de comprar o gás. Na favela a maioria não tem condições, as famílias que atendemos são compostas em sua maioria por mulheres que são o arrimo da casa, estão desempregadas e têm crianças pequenas”, conta.
A Cufa distribuiu no último ano somente no ABC 3 mil botijões de gás através de parcerias e doações de empresas. Desse volume 2,5 mil foram só para famílias de Mauá, o restante foi dividido entre São Bernardo, Mauá e Santo André.
A nota técnica de Lúcia Bicalho mostra que a substituição do gás pela lenha para cozinhar já estava ocorrendo nos anos anteriores à pandemia, pois, de acordo com os dados disponíveis do IBGE, registrou-se, entre 2016 e 2019, aumento de 18% para 21% no número de famílias que usam lenha ou carvão para cozinhar. Nesse mesmo período, o Balanço Energético Nacional aponta que a participação da lenha na matriz energética residencial subiu de 24,4% para 26,1% e o GLP recuou de 26,5% para 24,4%.
O problema é que o gás de cozinha não tem outro senão a lenha como substituto economicamente viável para as famílias de baixa renda. “As opções ao GLP são o gás natural encanado, mas que depende de uma malha de distribuição que só há em grandes regiões metropolitanas e é também mais caro. Outra opção ainda extremamente cara é usar a energia elétrica, mas os fogões elétricos não são acessíveis nem à classe média. As pessoas mais pobres não têm condições de pagar e escolhem; ou não comer ou usar lenha. Por isso os projetos de transferência de renda adotados por alguns governos são importantes”, aponta Lúcia.
No estado de São Paulo o Vale Gás oferece R$ 100 a famílias de baixa renda por três meses. Somente em Diadema o programa vai beneficiar 3.908 famílias, segundo o anúncio do vice-governador Rodrigo Garcia (PSDB), em visita à cidade quando do anúncio do futuro restaurante Bom Prato. Ao todo, o ABC tem 8.752 famílias cadastradas para receber o Vale Gás.
“O GLP vem do petróleo e a tendência é aumentar e, ao passo que o nível de pobreza vem aumentando, a melhor solução é mesmo a transferência de renda, já que outros projetos de energia para a população de baixa renda não são economicamente viáveis”, avalia a autora da nota técnica do Conjuscs.
Apesar do ABC ter várias envasadoras de gás, próximas a refinaria em Mauá o preço aqui não é muito diferente de outras regiões. O presidente da Associação Brasileira dos Revendedores de GLP, Alexandre Borjaili, diz que a questão logística não influencia muito o preço do produto final, por isso que, independente se está perto ou longe da refinaria, os preços são parecidos. “Recentemente o Estado de São Paulo aumentou a alíquota de 12% para 13,8%, mesmo assim o impacto não foi dos maiores como também no caso da logística, que não tem esse peso todo, o aumento vem da Petrobras. Com a venda da Liquigás, o monopólio que tínhamos de cinco empresas distribuidoras agora é de apenas três, quer dizer ficaram mais fortes ainda, então esse combinado entre Petrobras e distribuidora está mais forte. Elas aumentam no mesmo percentual valor como se todos os custos operacionais fossem iguais e quem está pagando a conta é quem mais precisa. A fome e a miséria no Brasil estão crescendo a cada dia mais e o gás é essencial no combate à fome, porque ele é a energia para fazer do fubá o mingau”, analisa.