CGU aponta sobrepreço em compra de ministério

A Controladoria-Geral da União (CGU) detectou sobrepreço de até R$ 130 milhões em uma megalicitação do Ministério do Desenvolvimento Regional (MDR), realizada em dezembro para comprar 6.240 máquinas pesadas, pelo valor global de R$ 2,89 bilhões, com recursos do orçamento secreto.

A apuração da CGU faz parte das ações de auditoria iniciadas após o Estadão revelar, em maio passado, o esquema montado pelo governo para garantir blindagem ao presidente Jair Bolsonaro no Congresso em troca de permitir a um grupo de políticos impor o que fazer com milhões de reais do orçamento. Parte determinou a compra de tratores e máquinas agrícolas, indicando até mesmo o valor e as cidades que deveriam receber – o que rendeu ao esquema o apelido de “tratoraço”.

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O Estadão revelou ontem que a CGU encontrou “risco extremo de sobrepreço” em convênio do MDR com prefeituras. Agora, uma nova auditoria indica que sobrepreço já foi identificado também em contratos feitos diretamente pela pasta com recursos do tratoraço.

O edital com sobrepreço de até R$ 130 milhões começou a ser preparado em julho de 2020, pela Secretaria Nacional de Mobilidade e Desenvolvimento Regional e Urbano, comandada por Tiago Queiroz, um advogado nomeado em maio de 2020 ao posto, por indicação do Republicanos e com aval do Progressistas, partido do presidente da Câmara, Arthur Lira (AL), e do ministro da Casa Civil, Ciro Nogueira.

A aquisição centralizada de máquinas, para posterior distribuição entre municípios, permitiria, em tese, a economia de valores, com ganhos de escala. No entanto, a CGU constatou que o edital foi feito com preços longe de trazerem qualquer vantagem aos cofres públicos. “Entende-se que há evidências suficientes para afirmar que há preços em alguns dos lotes do Edital nº 22/2020 expressivamente acima das médias das demais contratações públicas analisadas e, portanto, com sobrepreço na ordem de R$ 101 milhões”, diz trecho de nota de auditoria elaborada pela CGU, referente à parte do edital que trata da compra de motoniveladoras.

O ministério assinou atas de registro de preço para a compra de 1.544 motoniveladoras de uma única empresa, a XCMG Brasil Indústria Ltda., com valor de R$ 1,13 bilhão, para entrega de máquinas na maior parte dos Estados da federação. Desses valores, R$ 101 milhões seriam sobrepreço – isto é, valores que não deveriam ter sido pagos pelo governo, por estarem expressivamente acima dos preços de mercado.

A auditoria em andamento constatou ainda sobrepreço em atas de registro de preços para a compra de pás carregadeiras (R$ 14,1 milhões) e de escavadeiras hidráulicas (R$ 14,7 milhões). Daí o cálculo alcançar R$ 130 milhões.

A CGU apontou que a pesquisa de preços feita pelo ministério se baseou, predominantemente, em cotações feitas por fornecedores, o que contraria a instrução normativa nº 73/2021 do Ministério da Economia. A orientação geral é que o edital seja montado, prioritariamente, a partir de valores de contratações anteriores feitas pela administração pública, em vez de se sustentar com base no orçamento apresentado por empresas.

Entregue ao MDR, o documento da CGU frisa que, se a pasta quiser prosseguir com a licitação, deve promover o reajuste nos preços, para evitar o prejuízo aos cofres públicos.

No caso das motoniveladoras, o secretário Tiago Pontes Queiroz e o representante da XCMG assinaram, em fevereiro, um primeiro contrato para a compra de 61 ao preço de R$ 44 milhões. Desse valor, o governo já fez pagamentos de R$15,7 milhões à empresa, referente a 20 máquinas, já entregues em Paraíba, Pernambuco e São Paulo.

De acordo com os cálculos da CGU, houve sobrepreço na licitação para a compra das máquinas para entrega nesses três Estados. As máquinas da Paraíba, contratadas ao valor unitário de R$ 798 mil, não deveriam custar mais do que R$ 643,8 mil. As de Pernambuco, contratadas por R$ 802,5 mil, deveriam custar R$ 641 mil. E as de São Paulo, contratadas por R$ 774,1 mil, deveriam ser por R$ 638,5 mil. Assim, em vez dos R$ 15,7 milhões pagos pelas 20 máquinas, o governo deveria pagar, R$ 12,8 milhões. Como os valores já foram pagos pode configurar superfaturamento de R$ 2,9 milhões.

Ao receber as informações da CGU, o MDR decidiu iniciar trâmites para ajustar a licitação. A consultoria jurídica entendeu que era possível seguir adiante o acordo, mas recomendou a invalidação de todo o edital.

Em nota, o ministério disse que buscou as empresas vencedoras do certame para renegociar os preços e que, nos dois casos em que não foi possível a repactuação, cancelará a parte do edital referente a elas. A pasta confirmou que, na compra de motoniveladoras para São Paulo e Pernambuco, houve “cobrança de maior no valor de R$ 2,9 milhões” e disse que, “a partir de acordo realizado com a empresa, esse valor será devolvido”.

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