A pandemia da covid-19 acentuou as diferenças sociais em todo o País e no ABC não foi diferente. As prefeituras tiveram aumento de gastos na área de serviço social, principalmente no combate à fome. Como nem todas puderam aumentar o orçamento para a área, campanhas de doações foram desencadeadas para conscientizar a população sobre o aumento das necessidades dos mais vulneráveis. A região teve aumento de 11,2% do número de famílias inscritas em programas sociais, índice que os orçamentos não acompanharam.
O número de cadastrados cresceu substancialmente do período anterior à pandemia até agora, em média 11,2%, com variação de pouco mais de 2%, como registrado em Mauá, até 44% em Diadema, o que revela o aumento da vulnerabilidade social das famílias.
Em Diadema, o orçamento até encolheu, em 8,53%. A justificativa da Prefeitura é a de que a peça orçamentária deste ano foi elaborada pelo governo anterior. Para dar atendimento, criou o programa Sua Fome Me Incomoda, que incentiva a doação de alimentos às famílias de baixa renda. Em três meses arrecadou 210 toneladas de alimentos, entregues para mais de 40 mil famílias. O município entregou 1.305 cestas básicas. Além disso, disponibiliza programas, como o Hortas Comunitárias, com 24 hortas cultivadas por 470 moradores. Outro é o Banco de Alimentos, que atende 12.653 pessoas e que de janeiro a junho distribuiu 245 toneladas de alimentos.
São Caetano investiu mais
São Caetano foi a única cidade da região onde o orçamento para a área social aumentou mais que a demanda de famílias inscritas em programas sociais. Antes da pandemia a Prefeitura atendia em média 7,5 mil famílias em vulnerabilidade, número que saltou para cerca de 8,7 mil, alta de 16%. O incremento no orçamento da Pasta para este ano foi de R$ 7,4 milhões (22,71%), a maior alta percentual na região. Em janeiro de 2020 foram distribuídas 7.578 cestas, e no mesmo mês deste ano foram 8.071.
Rio Grande da Serra, além das cestas básicas, entrega pacotes de alimentos da agricultura familiar. Somente entre abril, maio e junho, distribuiu 1,5 mil cestas básicas e 1,8 mil cestas verdes (verduras e legumes). Esta última vem do Programa de Aquisição de Alimentos do governo do Estado, pro meio da produção de alimentos adquiridos de pequenos agricultores familiares. O programa já movimentou 21 toneladas de alimentos no primeiro semestre em Rio Grande da Serra. Ao todo, o município já distribuiu 58 toneladas de alimentos.
São Bernardo fez ponte entre a vacina, um momento de alegria e alívio para as famílias, e o apelo à solidariedade. Com a campanha Vacina Contra Fome, concede kits de alimentos a 2.965 famílias em situação de insegurança alimentar. Paralelamente, atende categorias de trabalho que tiveram perda total ou parcial em virtude da pandemia, por meio da Central de Doações. A ação atingiu mil toneladas, com mais de 67 mil atendimentos. O município oferta ainda Transferência Suplementar de Renda e o Programa de Aluguel Social para famílias vulneráveis. Além disso, as unidades do CRAS e do CREAS acompanham mensalmente 700 famílias com a oferta de cartão alimentação.
Santo André atendia antes da pandemia 21.399 famílias e hoje são 24.914, com cerca de 6 mil cestas básicas por mês. Entre as ações na área de alimentação tem o programa Moeda Verde, em 16 comunidades carentes. Há previsão de expansão para mais cinco núcleos até o fim do ano, como Chácara da Baronesa e Maurício de Medeiros. Até março de 2021, foram arrecadadas 424,5 toneladas de resíduos recicláveis e entregues 84 toneladas de alimentos do tipo hortifrúti. O orçamento da Pasta em 2020 foi de R$ 43.055.000,00, e neste ano a previsão é de R$ 46.828.000,00, alta de 8,77%.
Em Ribeirão Pires antes da pandemia eram 3,3 mil famílias classificadas em situação de extrema pobreza (com renda de de R$ 0 a R$ 89) inscritas no Cadastro Único. Em abril de 2021 o número saltou para 3.711, aumento de 12,45%. São famílias com perfil para o Programa Bolsa Família, contudo nem todas inscritas são atendidas pelo programa. O município distribui cestas básicas como benefícios eventuais, para atender as famílias mediante avaliação técnica. Mensalmente atende às famílias com média de 500 a 600 kits alimentos por meio dos quatro Centros de Referência de Assistência Social (CRASs). Com doações da Coop, mensalmente atende 130 famílias com hortifruti. O orçamento da Pasta se manteve em R$ 8.212.000,00.
Botijões de gás
Igrejas e entidades sociais e sindicais, que já faziam trabalho social, intensificaram as ações. Neste sábado (3/7) a Cufa (Central Única das Favelas), de São Bernardo, arrecadou e entregou 121 botijões de gás, 125 cestas básicas e kits de absorventes íntimos, em 40 favelas e comunidades da cidade.
Para Alex Camburão, presidente da Cufa na cidade, a situação econômica para quem mora em favela não apresenta sinais de melhora, mesmo com o avanço da vacinação. “As pessoas comemoram a vacina, mas na favela nunca teve distanciamento social, porque o pedreiro, o catador de reciclável, eles tiveram de sair para trabalhar, não teve jeito, é sair e esbarrar no vizinho. A cada dia que passa piora a situação das pessoas”, comenta.
A Cufa tem centenas de histórias, como a do comerciante Marcos Soares da Silva, de 50 anos, que contribuía mensalmente com dinheiro para ajudar nas ações sociais da central. Com a loja de bijuterias fechada, o negócio naufragou como tantos outros pequenos estabelecimentos. De contribuinte da Cufa, passou a ser ajudado pela central. Hoje Silva se mantém com poucas vendas online para se manter. Mas, também, passou a ser voluntário nas ações solidárias da entidade.
Pacote de bolacha
Marcos da Silva diz que o voluntariado o salvou da depressão. Da noite para o dia praticamente perdeu o negócio. Teve de vender o carro para pagar funcionários e até hoje não conseguiu saldar as dívidas dos impostos atrasados. “Como voluntário, noutro dia entreguei um pacote de bolacha na mão de uma senhora e o que ela me disse me tocou fundo, eram duas da tarde e ela contou que aquela era a primeira refeição do dia. Aquilo te acaba, pensar que se você não desse aquele pacote de bolacha, aquela pessoa não ia comer naquele dia, isso faz a gente pensar que por pior que você se sinta, tem gente em situação mais grave”, relata.
Apesar de todos os problemas que sofreu na pandemia, como tirar o filho da faculdade porque não dava para pagar a mensalidade, Silva diz que o voluntariado enriqueceu sua vida. “Antes da pandemia nunca imaginaria que ia passar por isso, mas foi a melhor experiência da minha vida, a gente aprende a ter empatia”, completa.