Lava Jato pediu suspensão de buscas em gabinete de denunciado por propinas da OAS

Seis dias antes da abertura da 73ª fase da Lava Jato, o Ministério Público Federal no Paraná pediu à juíza Gabriela Hardt, da 13ª Vara Federal de Curitiba, que suspendesse um dos mandados de busca e apreensão que já haviam sido expedidos no bojo da investigação contra supostos intermediários de propinas do ex-senador e atual ministro do Tribunal de Contas da União Vital do Rêgo – denunciado nesta terça, 25. A ordem seria cumprida na estação de trabalho de Alexandre Almeida (apontado como operador do ex-parlamentar) no gabinete do ministro do TCU, mas considerando a ‘insegurança jurídica’ sobre a discussão acerca do foro por prerrogativa de função’, a Procuradoria preferiu pedir o cancelamento da medida para ‘preservar a continuidade das apurações’.

A decisão que culminou na abertura da Operação Ombro a Ombro nesta terça, 25, foi proferida por Gabriela em junho, inclusive com a autorização para busca no gabinete de Vital do Rêgo – com restrição ao local de trabalho de seu suposto intermediário. No entanto, decisões dadas pelo Supremo nesse meio tempo – entre junho e agosto – fizeram a Lava Jato reconsiderar o pedido para evitar um possível trancamento das investigações.

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A mudança tem relação com processos envolvendo o senador José Serra, que foi alvo de duas operações em julho – a Revoada e a paralelo 23. A primeira foi aberta no início daquele mês, pela força-tarefa da Lava Jato em São Paulo, sendo que no mesmo dia, 3, a Procuradoria denunciou o parlamentar e sua filha pela lavagem transnacional de R$ 4,5 milhões em supostas propinas. Já a Paralelo 23, conduzida pelo Ministério Público Eleitoral paulista, foi aberta no dia 21 e investigava suposto caixa dois de R$ 5 milhões na campanha do tucano ao Senado, em 2014.

No âmbito da Paralelo 23, a PF tentou fazer buscas no gabinete do tucano no Senado, mas foi barrada. O presidente da Casa, Davi Alcolumbre, acionou o Supremo Tribunal Federal para suspensão da ordem – sob alegação de que uma uma busca e apreensão no local só poderia ocorrer com decisão da Corte Máxima – e o pedido foi acolhido pelo presidente do STF, ministro Dias Toffoli.

Pouco mais de uma semana depois, Toffoli ainda acolheu liminarmente pedido da defesa de Serra e, sob o argumento de violação da prerrogativa de foro, travou tanto as apurações da Revoada como as da Paralelo 23. Mesmo entendendo que a decisão do presidente do STF não atingia a denúncia contra Serra na Lava Jato, o juízo eleitoral suspendeu a ação que havia aberto contra o senador’, por cautela’.

Foi em tal contexto que os procuradores da força-tarefa da Lava Jato em Curitiba pediram para Gabriela Hardt cancelar mandado que havia sido expedido em junho – portanto antes dos desdobramentos do caso Serra.

“Recentemente, no entanto, tem sido novamente levada ao Supremo Tribunal Federal a discussão acerca do foro por prerrogativa de função e de investigações sobre fatos envolvendo agentes que ou não mais ostentam a prerrogativa constitucional ou exerçam cargos na atualidade sem relação com os fatos investigados, o que culminou, inclusive, na suspensão de investigações relacionadas à Operação Lava Jato. Diante da insegurança jurídica que se vislumbra sobre a matéria, especialmente pela possibilidade de ela ser invocada em decorrência do mandado expedido para a estação de trabalho do investigado nas dependências do TCU, e a fim de preservar a continuidade das apurações remetidas a esse Juízo por decisão do próprio STF, o Ministério Público Federal requer a suspensão do cumprimento do mandado”, escreveu a Procuradoria no pedido enviado para a 13ª Vara.

A solicitação foi feita na última quinta, 20, e acolhida por Gabriela Hardt no dia seguinte, às vésperas da deflagração da Ombro a Ombro. No despacho, a juíza destacou que a investigação relacionada à Vital do Rêgo foi enviada à 13ª Vara Federal de Curitiba pelo ministro do STF Edson Fachin, justamente em razão no entendimento da Corte sobre a perda da prerrogativa de foro ‘na hipótese de os fatos se relacionarem a cargo público diverso do atualmente ocupado pelo investigado’.

“A propósito, o Plenário do STF decidiu que se o crime praticado pela autoridade foi cometido no mandato anterior, o acusado continuará tendo direito ao foro por prerrogativa de função desde que ele tenha sido reeleito, de forma sucessiva e ininterrupta, para o mesmo cargo. No caso presente, Vital do Rêgo, além de não ter sido reeleito, passou a ocupar cargo diverso”, destacou a juíza.

Como mostrou o Estadão, o Supremo vai ter que revisitar o foro privilegiado, considerando as lacunas deixadas pelo próprio tribunal ao delimitar a prerrogativa. A Corte vai ter que discutir novamente o tema tanto no caso de Serra, como no caso do senador Flávio Bolsonaro (Republicanos-RJ), que tenta garantir que a investigação do caso Queiroz, revelado pelo Estadão, fique na segunda instância, e não na primeira.

Os desembargadores fluminenses deram ao filho do presidente da República o direito de ser julgado pelo Órgão Especial do TJ. No entanto, como mostrou o repórter Rafael Moraes Moura, os ministros do STF avaliam que o caso deveria tramitar na primeira instância, por não dizer respeito ao atual mandato de Flávio – seguindo inclusive a indicação feita por Gabriela Hardt dada no âmbito das investigações da Ombro a Ombro.

No caso de Serra, as liminares dadas por Toffoli vão passar pelo crivo do relator do caso, ministro Gilmar Mendes, uma vez que as decisões que travaram as investigações contra o tucano foram proferidas durante o plantão judiciário, quando cabe ao presidente da Corte analisar os casos mais urgentes.

No início do mês, a Procuradoria-Geral da República recorreu das decisões afirmando que o presidente do STF criou um foro privilegiado ‘por geografia’. Segundo a subprocuradora-geral Lindôra Maria Araújo, a suspensão de apurações no caso de Serra poderia criar uma ‘imunidade’ a investigados e levar à ‘mutilação dos órgãos de investigação’.

O caso do tucano ainda motivou pedidos da Câmara dos Deputados com relação a parlamentares que foram alvo da PF nos últimos meses. No caso de Paulinho da Força (Solidariedade-SP), que foi alvo da Operação Dark Side por suspeita de caixa dois de R$ 1,7 milhões e lavagem de dinheiro, o ministro Marco Aurélio negou o pedido para anular as buscas feitas no gabinete do deputado.

Já no caso de Rejane Dias, que é investigada na Operação Topique por supostos desvios através do superfaturamento em contratos de transporte escolar no Piauí, o ministro Edson Fachin pediu que a parlamentar fosse ouvida antes de ele tomar uma decisão.

A investigação que atingiu a deputada e primeira-dama do Piauí contou com aval da ministra Rosa Weber, que foi consultada sobre a competência para análise do caso para ‘evitar questionamentos’ e ‘pacificar a questão da competência’. O despacho de Rosa foi considerado ‘salutar’ pelos investigadores e foi proferido antes da Operação Paralelo 23, que reabriu o debate sobre o foro.

COM A PALAVRA, O MINISTRO VITAL DO RÊGO FILHO

O Ministro Vital do Rêgo foi surpreendido na manhã de hoje com a notícia de que procuradores da Força-Tarefa de Curitiba apresentaram denúncia nos autos de inquérito judicial que tramita há quase 5 anos e que dois procuradores-gerais da República – Rodrigo Janot e Raquel Dodge – não vislumbraram elementos para formalizar o pedido de ação penal.

Causa estranheza e indignação o fato de que a denúncia nasceu de um inquérito, aberto sem autorização do STF, Corte esta que ainda examina recurso contra a remessa da investigação para Curitiba/PR, em uma clara usurpação da competência do Supremo Tribunal Federal.

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