Há 14 anos o Brasil se tornava um dos 90 países do mundo com uma lei para punir aqueles que agridem mulheres. A Lei Maria da Penha, considerada uma das três mais avançadas do planeta pelo Fundo de Desenvolvimento das Nações Unidas para a Mulher (Unifem), ainda segue com diversas barreiras para ser plenamente cumprida. Em entrevista ao RDtv nesta sexta-feira (7/8), a delegada Raquel Kobashi Gallinati Lombardi, presidente do Sindicato dos Delegados de Polícia do Estado de São Paulo (Sindpesp), relatou que falta estrutura para o trabalho policial sobre o tema.
Apesar da busca por mais Delegacias de Defesa da Mulher (DDMs), principalmente aquelas que funcionam 24 horas, a falta de pessoal segue sendo um dos principais problemas. Segundo Raquel, o déficit na Polícia Civil é de 14 mil funcionários que poderiam ajudar as vítimas de violência doméstica independente se trabalhariam ou não em uma delegacia especializada.
“Todos os policiais estão aptos a dar todo o suporte necessário para a vítima e para investigar de acordo com a Polícia Judiciária, e o estado de direito em casos de violência contra a mulher. O que falta é estrutura real. Não é a estrutura administrativa, a forma de funcionamento das delegacias que impedem esse trabalho. O que impede esse trabalho é a falta de estrutura pelo governo, ou seja, contratação de delegados, contratação de policiais”, explicou.
Tal cenário também foi alvo de preocupações em meio a pandemia do novo coronavírus, principalmente levando em conta a dúvida sobre os números de casos de violência doméstica. Raquel explica que as estatísticas apresentam queda no número de denúncias, porém, acredita-se que exista uma grande subnotificação de casos devido às consequências da quarentena e do isolamento social, e da cultura machista e patriarcal ainda existente no Brasil.
“A vítima já é pré-julgada. ‘Será que ela deu ensejo para esse tipo de agressão? Será que ela mereceu esse tipo de agressão? Será que ela provocou o agressor?’. Então são pensamentos tão poluídos e tão deturpados que muitas pessoas ainda fazem o ciclo da violência contra a mulher que se inicia de maneira gradativa”, completou.
Segundo o Instituto Maria da Penha, o ciclo de violência acontece em três fases. Na primeira, denominada de “aumento de tensão”, o agressor mostra-se tenso e irritado por qualquer situação, humilha a vítima, realiza ameaças e destrói objetos. A vítima costuma negar o que ocorre e muitas vezes se coloca como a causa do problema.
A segunda fase é o “ato de violência”, momento em que a agressão ocorre de maneira verbal, física, psicológica, moral ou patrimonial. “Mesmo tendo consciência de que o agressor está fora de controle e tem um poder destrutivo grande em relação à sua vida, o sentimento da mulher é de paralisia e impossibilidade de reação”, relata o Instituto em seu site (institutomariadapenha.org.br).
Por fim, a fase do “arrependimento”, também conhecida como “lua de mel”. O agressor se transforma em uma pessoa amável que tenta a reconciliação afirmando que “nunca mais” vai cometer tais agressões e que “vai mudar”. Este momento pode misturar sentimentos de felicidade com medo e culpa pelo que ocorreu anteriormente, assim criando um cenário para a retomada da fase um.