Um estudo que integra a 13ª carta do Conjuscs (Observatório de Políticas Públicas, Empreendedorismo e Conjuntura na Universidade Municipal de São Caetano do Sul) mostra que os recursos já aplicados diretamente ou repassados a estados e municípios para o combate à covid-19 não chegaram nem à metade do orçamento que o Ministério da Saúde tem para essas ações. O levantamento foi coordenado pelo economista e coordenador adjunto do Conjuscs, Francisco Funcia, que prevê que sem uma mobilização da sociedade os recursos para a saúde ficarão ainda mais escassos no próximo ano por duas razões: se o governo federal reduzir o teto de gastos com a volta da emenda 95 e com a mudança de cálculo para repasse à atenção básica que está previsto no projeto de lei que trata das diretrizes orçamentárias para 2021.
Para o economista entre 30 de janeiro e 30 de junho foram 150 dias em que faltou coordenação para o enfrentamento do novo coronavírus. Para ele, apesar da criação da ação 21C0 no orçamento do ministério, muito pouco dessa verba foi de fato destinada a ações, maior parte ainda está represada. De acordo com o estudo para aplicação direta do Ministério da Saúde, não foram utilizados 73,5%; para transferência financeira aos municípios, não foram utilizados 65,6%; e para transferência financeira aos Estados e Distrito Federal, não foram utilizados 58,7%.
“Faltou foi uma coordenação nacional de enfrentamento, como medidas de proteção social para garantir o isolamento de forma mais efetiva, medidas de proteção econômica que permitissem aos pequenos e médios empreendedores a sobrevivência durante a queda da atividade econômica. Houve uma falta de articulação das ações envolvendo os estados e municípios. Para se ter uma ideia teve somente na primeira semana de abril, que o Ministério da Saúde recebeu recursos adicionais. Tinha que ser colocado recurso imediatamente para as compras e para transferir para estados e municípios e nada disso foi feito”, comenta o autor do levantamento.
Para Francisco Funcia a ação do ministério durante a pandemia é bem diferente de outras situações de enfrentamento. “Precisamos ter clareza que é a primeira vez que a gente assiste de forma bastante preocupada uma ausência de participação efetiva do ministério na articulação das políticas de saúde, tivemos o H1N1, a zika e a dengue, e que tivemos uma importante participação na articulação das políticas. Porém o Tribunal de Contas reprovou as contas dos os anos de 2.016, 2.017 e 2.018 porque não ouviu as recomendações do Conselho Nacional de Saúde. A comissão do orçamento que é órgão consultivo do conselho vem desde abril a apontando a não execução. Agora que teve a liberação de recursos depois da negociação com o Centrão, no Congresso. Em 15 dias teve uma liberação para estados e municípios que não teve em 130 dias anteriores. A covid acabou virando mais que uma moeda de troca”, comenta o professor da USCS.
Dos R$ 38,9 bilhões previstos o governo executou R$ 11,4 bi. Para Funcia o atraso é representado nos números da covid. “Esse atraso a gente não tira; tem muita coisa que tinha que fazer no tempo que não fez. Não adianta receber tudo de uma vez, essa baixa execução financeira é parte da explicação desse número grande de mortes que temos diariamente”, comenta o professor que considera que a situação pode ficar muito pior. “O Governo Federal encaminhou para o Congresso o projeto de lei das Diretrizes Orçamentárias para 2021 que aponta que vai voltar a adotar o teto das despesas primárias da emenda constitucional 95. Tem uma série de coisas que são despesas extraordinárias. Não pode chegar a 2021 e dizer que vamos voltar ao que era em 2019. Temos assistido quedas dos recursos, em 2017 o gasto foi 15,77% da Receita Corrente Líquida para a saúde, no ano passado foi menos de 14%. Tem reduzido ano a pós ano”, completa.
Outra situação que traz preocupação segundo o autor do estudo do Conjuscs é que portaria aprovada no ano passado define que o critério de transferência da União para a atenção básica nos municípios vai ser alterado. “A mudança vai reduzir a transferência de recursos para os municípios, tirando o critério populacional e colocando só quem estiver cadastrado nas unidades de saúde, essa diferença quem vai bancar são os municípios. E vai bancar no meio de uma crise de receita e quando os recursos vão diminuir com o teto de gastos. A sociedade tem que pressionar o Congresso para que a diretriz orçamentária não seja aprovada da maneira como foi encaminhada pelo governo e pela revogação da emenda 95”, sugere Francisco Funcia.