O brasileiro deixa tudo sempre para a última hora. Essa máxima não muda em tempo de crise financeira, em tempos de vacas gordas e em tempo de pandemia também. Nem a “esticada” de prazo para a entrega da declaração de imposto de renda, em dois meses, fez com que o contribuinte quitasse sua obrigação com o leão mais cedo. A menos de uma semana para o fim do prazo – 30 de junho – cerca de 9 milhões de contribuintes ainda não haviam entregue suas declarações segundo a Receita Federal. Até amanhã de quarta-feira (24/06) cerca de 23 mil declarações tinham sido entregues, mas são esperadas 32 mil declarações, ou seja, 28%, ou mais de um quarto dos contribuintes deixou o IR para a última hora
Em nota a Receita alerta para que os contribuintes não deixem a entrega para última hora. Se perderem o prazo, estarão sujeitos ao pagamento de uma multa mínima de R$ 165,74 e máxima de 20% do imposto devido. Para quem ignora os avisos, os erros de preenchimento, dificuldade de transmissão de dados e dúvidas na hora de preencher são problemas mais difíceis de solucionar quando se está cima da hora.
Para o professor de Ciências Contábeis da FAD/Uniesp (Faculdade de Administração Diadema) auditor e perito contábil, Marcelo Burgos, a maior dificuldade é juntar todos os documentos. “O primeiro passo é ser organizado e separar a documentação, os informes de rendimentos, os bens comprados ou vendidos, despesas médicas, odontológicas os recibos com o CNPJ do médico. Acontece muito das pessoas não terem tudo e aí vão fornecendo aos poucos”, diz o professor que também é sócio da C&F Contadores & Consultores Financeiros.
O professor Gerson Pires, coordenador do curso de ciências contábeis da Universidade Anhanguera, campus Industrial, em Santo André, tem exatamente a mesma opinião. “A maior dificuldade é juntar as informações de bancos e despesas”. Esse é o caso de Rene Martines, de 58 anos, que é controlador de acesso em um condomínio em Santo André. Ele tem a renda do trabalho assalariado e também da aposentadoria que recebe do INSS (Instituto Nacional do Seguro Social). Ele até tentou antecipar a declaração, mas não conseguiu os informes de rendimentos. “A empresa e nem o INSS me passaram os informes, aí fico com dúvida se espero ou lanço a somatória dos comprovantes e holerites. Outra dúvida é se tenho que declarar o INSS”, indaga o contribuinte que vai cobrar as informações para depois fazer a sua declaração.
O professor da Anhanguera diz que essa é uma dúvida recorrente e muitos contribuintes, optam por não declarar a aposentadoria o que é um erro. “Se ele ganha R$ 2 mil de salário e mais R$ 2 mil de aposentadoria, a priori seria isento, mas se não declara um a Receita vai saber que a renda dele foi de R$ 4 mil e não R$ 2 mil. Para a Receita isso é motivo para cair na malha fica a aí vai ter que fazer uma declaração de ajuste, senão terá problema no CPF”, explica Gerson Pires.
O consultor e professor, Marcelo Burgos, relata outra situação que gera dúvidas e pode levar o contribuinte a ter problemas com o leão. “Um ponto que pode fazer cair na malha fina é o cruzamento de informações, por exemplo: num casal, quando os dois fazem a declaração separados e colocam o mesmo dependente (filho) nas duas. O melhor é ver qual a melhor opção e apenas um dos dois colocar o filho como dependente”, analisa. “Tem também o casal em que os dois têm renda, mas é feita uma só declaração onde um é colocado como dependente e a renda deste não é informada. Esse é outro erro. Tem que declarar as duas rendas e eu recomendo declarações separadas”, aponta.
Recebimento de aluguéis é uma questão que o contribuinte fica se perguntando se vai ou não colocar na declaração do IR. Não informar pode trazer problemas segundo Gerson Pires. “Muitas vezes o contribuinte não declara porque acha que a receita não vai encontrar, mas as imobiliárias são obrigadas declarar o recebimento mensalmente, portanto não tem como fugir, se não fizer depois vai ter que pagar o imposto devido, com multa e juros”, explica.
O coordenador do curso de Ciências Contábeis da Anhanguera avalia que a maioria das declarações e Imposto de Renda são as mais simples, aqueles que confrontam os recebimentos e algumas despesas médicas. “O perfil da declaração de imposto de renda do brasileiro é, em média informe da renda do trabalho assalariado”, estima.
Mas quando as declarações ficam mais complexas, como com o pagamento de pensão, recebimento de aluguel, tem outros imóveis para declarar, recorrer a um profissional de contabilidade é uma saída. Em média, para fazer uma declaração de pessoa física, o preço pode variar de R$ 100 a R$ 200, dependendo da complexidade. A média de R$ 150 é o mercado quem define, não há uma regulamentação. É o que lamenta o professor e sócio da C&F Contadores & Consultores Financeiros. “Deveria ter uma tabela, o conselho poderia colocar um parâmetro, como existe para o advogado a tabela da OAB (Ordem dos Advogados do Brasil)”, disse Marcelo Burgos que tem escritório em Diadema e que está sobrecarregado de trabalho até terça-feira (30/06) quando termina o prazo para entrega da declaração. “Vou trabalhar o final de semana inteiro sem descanso”, completa.
Financiamentos
O professor Gerson Pires diz que outro erro que os contribuintes cometem ao fazerem a declaração está na aquisição de um bem financiado. Deve-se informar o valor total, o valor que já foi pago, ou os dois? A resposta é simples; apenas o que foi pago. “Essa é uma dúvida constante; o contribuinte compra um carro de R$ 50 mil, em outubro de 2019. Até o fim do ano ele pagou R$ 3 mil desse carro. Aí ele informa o valor de mercado, de R$ 50 mil, mais os R$ 3 mil que pagou. Isso está errado. Tem que informar o bem que comprou e os R$ 3 mil pagos naquele ano. A receita não quer saber valor de mercado, receita é caixa, é o que pagou e pronto. No ano seguinte ele pagou mais R$ 12 mil então declara R$ 15 mil e assim por diante”, orienta.
Este ano a Receita Federal fez poucas mudanças no IR. Uma delas é que não se pode mais deduzir o pagamento do INSS do trabalhador doméstico, antes podia. Outra mudança é que não é mais necessário informar o número do recibo de entrega da declaração do ano anterior. Em geral as dúvidas e os problemas surgem quando se deixa para fazer nos últimos dias. “O leão não é tão ruim assim, basta se organizar”, completa Burgos.