Uma aluna do curso de Ciências e Humanidades da UFABC (Universidade Federal do ABC), campus São Bernardo, alega ter sido constrangida e proibida de assistir aula porque estava acompanhada de seu filho, Abel, de quatro anos. A estudante Nathália Gastaldo, de 26 anos, trabalha de manhã e de tarde, e nem sempre tem com quem deixar a criança na hora em que vai para a universidade, à noite.
O fato aconteceu na última terça-feira (8/10), durante aula de Bases Epistemológicas da Ciência Moderna. De acordo com a estudante, logo no início da aula, foi indagada pela professora sobre o motivo da criança estar na sala. “A partir daí começou um questionário e constrangimento na frente de todos os colegas de classe com perguntas sobre meu filho”, relatou a aluna.
No decorrer da disciplina, enquanto produziam atividade em sala de aula, a aluna conta que tentou uma aproximação entre a professora e Abel, que foi até a mesa da docente para oferecer um salgado. “No mesmo momento ela falou para ele guardar o salgado com ele em tom grosseiro, sem necessidade”, acrescenta. Ao final do período, Nathália conta que a professora informou que não poderia assistir às aulas com a criança, e solicitou que, nas próximas aulas, não o levasse.
Os integrantes do grupo de trabalho de Nathália contam que, um dia após o ocorrido, receberam um e-mail da professora com o seguinte informe: “Aos alunos do grupo de seminário sobre ‘Copérnico’, estou comunicando que a aluna Nathalia Gastaldi NÃO está autorizada a participar das atividades relacionadas ao seminário”, diz.
Diante ao fato, Nathália diz estar decepcionada com a postura da professora, uma vez que a própria estudante não foi contatada com os motivos da proibição. “A professora sequer entrou em contato comigo, ao contrário, eu encaminhei um e-mail sobre minha situação e ainda assim fui ignorada”, conta.
O caso não é inédito na vida da estudante. No ano passado foi necessário que Nathália trancasse o curso por pelo menos três quadrimestres para que conseguisse conciliar sua rotina e levar seu filho para a Universidade menos dias na semana, sem prejudicar os estudos. “Levo o Abel no máximo duas vezes por semana, e ainda assim recebia olhares e comentários hostis”, relata.
Em 2017, a mãe natural de São Caetano comemorava a retomada na vida estudantil: foi aprovada em primeiro lugar no curso de humanidades da Universidade Federal do ABC, como cotista por ser aluna da rede pública, pelo Sistema de Seleção Unificada (Sisu). Diante das dificuldades em receber comentários agressivos, ser mãe solo e precisar conciliar carreira e maternidade, Nathália diz não se desanimar da rotina acadêmica.
Sem regulamentação de leis a respeito do assunto, a professora e doutora da Faculdade de Direito de São Bernardo, Carmela Dell’Isola afirma que faltam políticas públicas de inclusão para as estudantes mães que sofrem com estes problemas. “Na legislação que temos não existe algo que regulamente a inclusão. Por outro lado, até mesmo por questões pessoais, o ideal seria que a universidade se palpasse em questões de solidariedade e empatia para dar uma direção correta a mãe e consenso entre as partes”, afirma.
Ato de repúdio
Em solidariedade à mãe frente a exclusão da aluna na disciplina da Graduação, o Coletivo de Mães e Pais – formado por estudantes, docentes e membros de 15 entidades e do Diretório Central dos Estudantes – emitiram nota via redes sociais sobre o ocorrido e organizam ato de repúdio, na próxima quinta-feira (17), a partir das 14h na Sala dos Conselhos, no campus Santo André, durante reunião da comissão de graduação.
O motivo do ato será a cobrança da universidade sobre as providências a respeito do acolhimento de mães na universidade. De acordo com a direção do Coletivo, o Plano de Desenvolvimento Institucional da UFABC estabelece a inclusão social como um dos fundamentos da universidade, ao lado da excelência e interdisciplinaridade. No entanto, a inclusão social não é uma ideia abstrata.
“Ela se materializa em pessoas com necessidades particulares, condições específicas e ações institucionais. Ignorar que em nossa comunidade há mães, cujos filhos terão de acompanhá-las pela absoluta falta de políticas públicas de apoio à maternidade é o oposto de inclusão social”, diz a nota.
Em entrevista ao RD, a Diretora de Mulheres do DCE, Allana Mattos dos Santos, afirma que junto ao diretório, presta apoio a aluna e outros estudantes que enfrentam casos que envolvem discriminações, preconceitos ou injúrias. “O DCE está dando suporte as decisões do Coletivo de Mães e Pais, e vai compor junto ao Coletivo o ato de quinta-feira. Queremos uma explicação e estamos orientando a aluna para organizações de apoio a mulheres vítimas de violência, que temos contato”, alega.
Em nota, a reitoria da Universidade Federal do ABC informa que tomou conhecimento sobre o fato, orientou a aluna para que a mesma apresentasse sua queixa aos órgãos de controle da instituição, que receberam a informação e deram início ao processo de apuração de fatos, segundo os critérios que regem o comportamento disciplinar dos servidores públicos federais. A instituição afirma ainda que, em paralelo, foi atendida a solicitação da aluna de ser transferida de sala de aula. O caso está sendo acompanhado pelas duas pró-reitorias da Universidade.