Uma força-tarefa que reúne sindicatos, governos das três esferas, municipal, estadual e federal, vai tentar uma solução para a questão financeira da General Motors da América Latina, com a sua primeira reunião nesta terça-feira (22/01) em São José dos Campos. A presidente global da empresa Mary Barra, ao fazer balanço, deu sinais de que a GM considera sair da América do Sul e o presidente para o Mercosul, Carlos Zarlenga, repercutiu essa posição em e-mail e comunicados fixados nas fábricas na última sexta-feira (18/01) gerando muita preocupação em relação a continuidade da fábrica de São Caetano, onde trabalham cerca de 4,5 mil operários. “Não vamos continuar investindo para perder dinheiro”, disse Mary a um jornal de Detroit, onde está a sede da empresa. Carlos Zarlenga, presidente para o Mercosul, afirmou que a GM teve prejuízo significativo de 2016 a 2018 e que “2019 será um ano decisivo para nossa história”. Segundo ele, a empresa vive momento crítico “que vai exigir importantes sacrifícios de todos”.
Segundo o secretário da Fazenda de São Caetano, Jefferson Costa, se o anúncio se concretizar o prejuízo para a cidade será enorme; só de ICMS (Imposto Sobre Circulação de Mercadorias e Serviços) a cidade vai perder R$ 80 milhões por ano, o que pode implicar no cancelamento de uma série de serviços à população. “É com surpresa que recebemos essa informação e aguardamos um posicionamento oficial da empresa. Falar da perda da General Motors significa de forma direta um impacto de R$ 80 milhões só de ICMS por ano, além do que, como São Caetano se coloca como importante polo regional de oferta de serviços, sobretudo sociais, sem sombra de dúvida perderia a capacidade de ofertar esses serviços e, portanto, impactaria de forma direta a nossa região. Aguardamos com certa serenidade, mas com toda a atenção necessária, o desfecho dessa situação”, analisou.
A preocupação é tanta que há uma mobilização regional para a busca de soluções de manutenção da fábrica, uma delas é a participação do prefeito José Auricchio Jr. (PSDB) na reunião desta terça-feira. A Câmara também vai montar uma comissão de acompanhamento e até o deputado eleito Thiago Auricchio (PR) que ainda nem tomou posse, fez comunicado em redes sociais demonstrando vontade de contribuir nas reuniões. “Temos trabalhado com todos os esforços para sermos um grande parceiro para a planta de São Caetano e nesse momento tem que haver um grande esforço coletivo, envolvendo o poder público através das prefeituras, do governo do estado e do governo federal, do setor produtivo como um todo, dos fornecedores, da classe sindical de forma muito especial, dos revendedores para que esse esforço produza a diferença que se faz necessária para que a GM avance na questão dos investimentos para a América Latina em especial para São Caetano. A partir de 2020 vamos ter um novo ciclo de produção de automóveis onde queremos estar na frente, não só em relação a permanência, mas com a geração de emprego e renda”, disse o prefeito Auricchio. Seu filho e deputado estadual eleito, Thiago Auricchio (PR), divulgou vídeo em sua rede social em que diz que quer se colocar a disposição para garantir a permanência da fábrica.
O presidente da Câmara, Pio Mielo (MDB) anunciou que esteve com o vereador Moacir Rubira (PRB) e o republicano informou que irá protocolizar um pedido de instalação de uma Comissão de acompanhamento. “Fomos pegos de surpresa da possibilidade, ao que parece real, do fechamento da fábrica de São Caetano e não podemos assistir essa cena de maneira omissa. O que a Câmara puder fazer somando forças com o prefeito Auricchio, fará, pois é nossa obrigação lutar pela permanência dessa grande empresa”, disse o emedebista.
O presidente do Sindicato dos Metalúrgicos de São Caetano, Aparecido Inácio da Silva, o Cidão, disse que a fábrica da cidade está melhor preparada e equipada para enfrentar a crise global da empresa. “Fomos pegos de surpresa, mas estamos preparados para discutir e manter os empregos aqui em São Caetano e trabalhando com os demais sindicatos, para viabilizar a continuidade da empresa na América Latina, principalmente aqui em São Caetano, haja visto que já fizemos um acordo há dois anos atrás que redundou no investimento em modernização da planta de US 800 milhões, talvez a nossa planta esteja um pouco mais confortável nas medidas que eles querem adotar, mas não podemos ficar abrindo mão dos direitos dos trabalhadores e vamos defender esses direitos ao máximo para que não tenham perda do poder aquisitivo”, disse o dirigente sindical.
Crise é oportunidade para discussão sobre gargalos da produção e carga tributária
Empresários e trabalhadores custam a acreditar que a GM saia do país. A companhia é líder de vendas no Brasil, o seu modelo Ônix é o veículo mais vendido. “Há três anos a companhia é líder de vendas, isso até pode ser uma jogada e eles tem poder para isso”, analisa o empresário e ex-diretor do Ciesp (Centro das Indústrias do Estado de São Paulo), William Pesinato, que avalia que o impacto em toda a região seria grande, se a situação anunciada se concretizar. “Vai ser complicado, as empresas fornecedoras vão ter que redirecionar sua produção para outros e haverá um corte generalizado de pessoal, a indústria da região vai ter que se adaptar”, analisa.
O vereador de Mauá, e trabalhador licenciado da GM, Marcelo Oliveira (PT) acredita que a matriz está pressionando as filiais para ter melhor resultado e por isso ameaça de fechamento. “Estão pressionando para ter benefícios e no fim quem paga a conta é o trabalhador. Lembro-me da crise de 2007 quando a empresa estava em crise nos Estados Unidos e as plantas daqui mantiveram o grupo, agora tratam a filial desta forma”, critica.
O professor de economia da USCS (Universidade Municipal de São Caetano do Sul), Jefferson José da Conceição, acredita que o aviso da GM não deve ser considerado um blefe por melhores lucros no Brasil e Argentina. Para ele a situação pode abrir a possibilidade de construção de um novo modelo. “O aviso deve ser considerado pelas instituições governamentais sim. Uma cidade como São Caetano e a região do ABC dependem muito da produção e da tecnologia que uma empresa desse porte traz. Uma montadora não é só produção, tem também universidade, laboratórios, fornecedores, é uma coisa muito mais ampla. Os EUA passam por um momento de reindustrialização e talvez o layout da unidade de São Caetano seja de difícil atualização, por isso me preocupo, mas por outro lado vejo que a crise pode gerar oportunidades como foi a Câmara Setorial entre 1991 e 1992. Vejo aqui algo semelhante A estrutura tributária brasileira é bastante perversa e esse pode ser um momento para essa discussão”, disse o economista.