O estudo “Conhecendo o superendividado do estado e também do Grande ABC”, divulgado nesta terça-feira (16/10) como parte integrante da Carta de Conjuntura da USCS (Universidade Municipal de São Caetano do Sul) revela que voltou a crescer o percentual de desempregados endividados no ABC, índice que chegou a cair no primeiro semestre deste ano para 11,3%, agora essa faixa de devedores representa 19,7%. O estudo foi coordenado pelo professor Vinícius Oliveira Silva, que considera que a falta da disciplina Educação Financeira, nas escolas, poderia minimizar o problema. “Colocaria na cabeça delas os limites orçamentários, esse que é o grande problema. As pessoas gastam mais do que podem, além do limite, porque não se deram conta que tem esse limite; aí por causa da pressão da sociedade ou da família, vai comprando porque encontra linhas de crédito fácil”, comenta o professor.
O perfil do superendividado no ABC é composto por mulheres em sua maioria (56,4%); 76% dos cadastrados no Programa de Apoio ao Superendividado do Procon está com o nome negativado; tem em média 1,8 dependentes; 21,6% estão pagando casa própria e 60% não tem carro. A renda média do endividado da região é de R$ 2.939 e os cadastrados tem despesas de R$ 4.552 mensais. Os endividados possuem dívidas com uma média de 3,6 credores. Segundo o pesquisador, não foi possível estabelecer um valor médio da dívida, por conta de muitas disparidades em relação as informações que chegam ao Procon fonte das informações e que mantém um atendimento específico para os superendividados.
Dentro do perfil está a professora e coordenadora pedagógica Marilaine Martines, de Ribeirão Pires, que vivia com um bom salário, mas de repente viu sua renda cair bruscamente com redução do número de aulas. Isso foi em 2001, e ainda hoje ela se recebe telefonemas de cobrança, mesmo já estando com o nome limpo nos cadastros de proteção ao crédito. “Eu ganhava cerca de R$ 8 mil, e passei a ganhar R$ 950 de um dia para o outro. A renda caiu demasiadamente, cheguei ao ponto de pensar em tomar remédio para me matar, porque eu tinha um financiamento de 20 anos, da minha casa. Eu tinha medo que fossem me tirar a casa”, relembra. A educadora disse que atualmente seu cadastro é positivo e mesmo assim recebe ligações constantes de escritórios de cobrança. “Chegam insultar”, comenta.
Dos motivos que levam ao endividamento, o descontrole financeiro e o desemprego estão entre os dois principais, desde 2005; na época o descontrole era a causa de 58,3% dos endividamentos, no segundo semestre deste ano esse quesito ainda é o principal, mas caiu para 38,2%. O desemprego chegou a ameaçar a liderança do descontrole, no segundo semestre de 2016, no auge da crise econômica, caindo para 11,3%, mas voltou a crescer substancialmente nos últimos quatro meses, chegando a 19,7%.
Para o professor da USCS, a oferta de crédito fácil ajuda a agravar o endividamento. “Como o crédito vem muito fácil as pessoas vão gastando. Como estamos num período econômico conturbado, uma hora extra que deixa de fazer, já impede de pagar uma conta e no mês seguinte a dívida vem maior por causa dos encargos”.
Endividados por negócios que não deram certo mais do que dobram em três anos
A crise financeira que empurrou desempregados forçadamente para o empreendedorismo em busca de renda, fez dobrar o número dos superendividados, segundo o estudo da USCS. No segundo semestre de 2015, 2,8% das pessoas que tiveram problemas com dívidas, tentaram empreender e o negócio foi mal sucedido. Agora esse percentual é de 6,6%, ou seja, mais do que dobrou o índice.
“A situação econômica prejudica muito as pessoas, pela redução da renda, aí as pessoas perdem o emprego e tentam empreender só para conseguir uma renda, aí o negócio não dá certo e fica a dívida. Pode ser o Mei (Micro Empreendedor Individual) formal ou mesmo o negócio informal, aquele em que o cidadão monta uma barraca de lanches”, analisa o professor Vinícius Oliveira Silva, da USCS, que aponta também as separações como outro índice importante do superendividamento que cresceu quase quatro pontos percentuais, de 2015 até agora. “As pessoas separam e ficam as dívidas. Entrevistei pessoas que dizem que assumiram as dívidas do ex-cônjuge. Esse é um aspecto em que as pessoas se endividam involuntariamente; como no caso de doença ou morte de familiar. A pessoa não procura o endividamento, mas para salvar parente ou a si mesmo, vê somente qual o cartão que o local aceita e depois fica com a dívida. Tem o devedor ativo e o passivo. O ativo é aquele que sai gastando sem controle”, conclui o professor.