A Constituição Federal, também conhecida como Constituição Cidadã, completa neste dia 5, sexta-feira, 30 anos de promulgação. “Foi a sociedade, mobilizada nos colossais comícios das Diretas Já, pela transição e pela mudança, que derrotou o Estado usurpador. A Constituição pretende ser a voz, a letra e a vontade política da sociedade brasileira rumo à mudança. Que a promulgação seja o nosso grito”, assim discursou o deputado federal Ulisses Guimarães, na madrugada do dia 5 de outubro de 1988, após a conclusão dos trabalhos da Assembleia Nacional Constituinte, que envolveu 594 parlamentares – sendo 512 deputados e 82 senadores. Apenas 26 eram mulheres.
O RDtv, canal com programação diária do Repórter Diário nas redes sociais, realizou na quarta-feira (3) programa especial com debate sobre a data. Participaram do encontro o presidente da OAB (Ordem dos Advogados do Brasil), subseção São Bernardo, Luís Ricardo Davanzo; o presidente do Conselho Regional de Prerrogativas da OAB, Antônio Carlos Cristiano; e a coordenadora do curso de Ciências Sociais da Metodista, Claudete Pagotto.
A Constituição levou o apelido de Cidadã porque incluiu os direitos fundamentais dos cidadãos e, assim consolidou a Democracia, após 20 anos de Ditadura Militar. O jurista Dalmo Dallari destacou o artigo 5º da Constituição, ao comentar no site da Câmara Federal, quando dos 15 anos da Carta Magna. “É o artigo 5º da Constituição que garante ao cidadão o direito à propriedade, à liberdade de ir e vir, de se expressar, de ter a religião que quiser, de ter garantida a inviolabilidade de seu lar, de sua correspondência, de suas contas bancárias. É este artigo que garante tratamento humano, que proíbe a tortura, que garante a herança, o direito à ampla defesa, à Justiça gratuita aos necessitados, a presunção da inocência…”, analisou.
Participação popular
A professora da Metodista considera a participação popular o ponto mais importante. Diz que a Constituição de 88, em particular, é a mais democrática da história das constituições, é a sétima e a segunda mais duradoura de todas, sendo que duas foram impostas. Para a cientista social, a participação popular é o elemento chave para o poder constituinte que mobilizou setores liberais do contexto da ditadura. “Os movimentos sociais deixaram a luta armada, para uma participação institucional. Naquele momento a gente identifica uma resposta importante de constituir, pactuar e trazer o consenso social novamente. Portanto, o principal fator foi a participação popular, o que não significa que tenhamos alcançado a participação popular ampla. As conquistas foram colocadas e foram grandes, mas se revela um desafio trabalhar por elas”, comentou.
O advogado Antonio Carlos Cristiano é da mesma opinião. “Está em evolução e amadurecendo dentro destes 30 anos, adquirimos dispositivos, mas tem de trazer uma cultura de investimento associada à Constituição, quero dizer na Educação, e é através dela que se adquire informação e nasce o debate na sociedade”, apontou.
Especialistas rebatem ideia de nova Constituinte
A proposta levantada durante o debate eleitoral sobre uma nova Assembleia Nacional Constituinte tem resistência dos especialistas. O presidente da OAB de São Bernardo, Luís Ricardo Davanzo, se diz grande admirador da Constituição e que, apesar de ter mais de uma centena de mudanças, ainda merece elogios. Diz que a espinha dorsal é maravilhosa. Há necessidade de um período de maturação do ordenamento jurídico e nestes 30 anos percebemos que os brasileiros já conhecem a Constituição. “Estamos mais cultos; hoje as pessoas têm o entendimento maior dos seus direitos, mas falta ainda um conhecimento maior das obrigações. Temos de colaborar também para que necessitemos de uma intervenção estatal mínima na nossa vida”, destaca Luís Davanzo.
Para a professora Claudete Pagotto, da Universidade Metodista, muitas das políticas públicas que hoje são banais, consolidadas, foram frutos da Carta Magna de 1988. A cientista social citou, por exemplo, a estrutura da saúde pública e a educação. Aponta como grande avanço da Constituição a conquista do SUS (Sistema Único de Saúde) e afirma que a reforma sanitária resultou no SUS e 75% da população usa o sistema. “A reforma urbana revela que toda propriedade tem de ter função social e se coloca aí o direito à moradia digna e uma sociedade sem discriminação, sem preconceito e com trabalho”, comentou ao citar que outro avanço é a universalização da Educação. “Temos um currículo escolar que permite ter história, geografia, sociologia, isso está consolidado, o problema é avançar e debater sobre os valores, a justiça e sobre os 300 anos de escravidão”, desafiou Claudete.
Antonio Carlos Cristiano defendeu ensinar sobre a Constituição desde o ensino fundamental para os jovens entenderem o que é a democracia. Para Davanzo, a comunicação tem melhorado, com acesso à internet e redes sociais. “As pessoas vão buscar, vão descobrir do que se trata, cada dia mais, a Constituição vai fazer parte da vida do cidadão brasileiro”, acrescentou.
Claudete Pagotto chamou atenção para os mecanismos assegurados pela Carta Magna e que garantem a participação popular, como a Adin (Ação Direta de Inconstitucionalidade). “Queria chamar atenção a este dispositivo, para a população entender que não é algo tão distante”, disse. Davanzo acrescentou que o Brasil ainda precisa de mudanças com base constitucional. Necessita passar pelas reformas tributária e previdenciária e a mais importante é a reforma política. “Daí a importância de termos bons operadores no Legislativo e gente com experiência nos estados e municípios, que saibam lidar com o Congresso e as câmaras”, disse.