Todo o cenário de desorganização política em Mauá reflete na Saúde, setor crítico para população, mas que agora corre o risco de colapso. Com contrato para vencer no dia 30, a FUABC (Fundação do ABC) cobra com urgência do Paço o valor de R$ 2,9 milhões para manutenção dos serviços na rede municipal. Nesta quinta-feira (21), o governo transferiu R$ 500 mil, para compra de insumos hospitalares e reposição de estoques do Hospital de Clínicas Doutor Radamés Nardini.
Com débitos que superam R$ 123 milhões, a FUABC já não consegue pagar normalmente fornecedores e quadro de pessoal no complexo de saúde em Mauá. As primeiras medidas urgentes para preservar os atendimentos essenciais foram tomadas, como cancelar todas as cirurgias eletivas – sem urgência – por tempo indeterminado e passar a estudar a possibilidade de restrição no PS (Pronto-Socorro) do Nardini.
Reinaugurado em dezembro do ano passado, o PS do Nardini foi alvo de propaganda de promoção governamental do prefeito afastado Atila Jacomussi (PSB) pela cidade. Entretanto, naquele momento, o socialista já estava em pé de guerra com a FUABC, pagava R$ 12 milhões por mês, sendo que o contrato para manutenção dos serviços previa repasses de R$ 15,6 milhões.
A FUABC atesta que a partir do novo PS no Nardini, as despesas com insumos cresceram em 40%, enquanto os exames de ultrassonografia aumentaram em 50%, o que obrigou a organização a dobrar o número de plantões. Sem as contas fecharem, a entidade admite analisar a possibilidade restringir o setor para casos graves, com atendimentos iniciais nas três UPAs (unidades de pronto atendimento) da cidade.
De acordo com a organização, há débitos trabalhistas de ex-funcionários e 13º salários do quadro de pessoal pendentes, enquanto fornecedores ameaçam paralisar os serviços. Há parcelas vencidas com as empresas fornecedoras de mão de obra para serviços de plantões médicos (R$ 1,1 milhão) e de exames de imagem – como raio-x, ultrassom e tomografia – (R$ 224 mil).
Enquanto isso, o fornecedor responsável pelos exames de análises clínicas no Nardini confirmou à FUABC que o estoque de insumos termina até o próximo fim de semana. A entidade regional, porém, espera ter à disposição os R$ 500 mil repassados pela Prefeitura de Mauá a partir desta sexta-feira (22), para evitar o colapso.
Negociações
Na iminência de um colapso, as negociações pela renovação do contrato entre a FUABC e o governo da prefeita em exercício Alaíde Damo (MDB) estão em completo segundo plano para a entidade. Nesta segunda-feira (18), a emedebista tomou consciência do quadro crítico na rede municipal de Saúde e a necessidade de repasse emergencial de R$ 2,9 milhões, devido ao risco de paralisação dos atendimentos.
O contrato vigente com a FUABC originalmente se encerrou em 28 de fevereiro, mas houve duas prorrogações, a primeira de 30 dias e a segunda por mais 90 dias. No entanto, o governo não se preparou nesse período para uma saída da organização, que administra o Nardini, além de oferecer mão de obra e estrutura para 23 UBSs (unidades básicas de saúde), três UPAs e outros serviços públicos.
Provocado pela FUABC para analisar o convênio, o MP-SP (Ministério Público de São Paulo) analisa a situação e deve determinar por quanto tempo mais a entidade seguirá em Mauá, até que a situação se normalize. Não está descartada a renovação do contrato pela organização, situação defendida pelo núcleo duro de Alaíde, que internamente, mantém o otimismo pela continuidade da entidade no município.
Caos político agrava quadro
Muito da crise existente na Saúde em Mauá passa pelo cenário de instabilidade política na cidade, que teve a prisão do prefeito afastado Atila Jacomussi (PSB), a saída de dois titulares no comando da Secretaria de Saúde e quatro superintendentes do Hospital de Clínicas Doutor Radamés Nardini. Desde o ano passado, o governo diverge com a FUABC (Fundação do ABC) sobre o valor do passivo que já supera R$ 123 milhões.
Mauá está sem secretário de Saúde desde abril, quando Ricardo Burdelis pediu exoneração após 51 dias no cargo, por ingerências de Atila. Em dezembro, o ex-vice-prefeito Márcio Chaves (PSD) deixou o posto por razões semelhantes e assumiu a mesma Pasta em Santo André. Ambos puxavam as negociações com a FUABC, para recálculo da dívida e a redução dos repasses mensais previstos em contrato.
Burdelis solicitou à FUABC a última prorrogação contratual em março, por 90 dias (termina ao fim deste mês), para resolver o impasse, porém, o seu desembarque na Prefeitura de Mauá novamente estagnou as mesas de negociações. Dessa forma, o governo pouco avançou nas tratativas, tanto para renovação do contrato ou a uma hipotética saída da organização na rede municipal.
Em 9 de maio, quase um mês após a saída de Burdelis, Atila recebeu voz de prisão pela PF (Polícia Federal), pela Operação Prato Feito, que apura desvio de recursos públicos nos serviços de merenda, uniformes e materiais didáticos em 30 cidades paulistas. O socialista foi enquadrado por suspeita de lavagem de dinheiro, por não conseguir comprovar naquele instante a origem de R$ 87 mil em notas vivas no seu apartamento.
A FUABC também foi atingida pela Operação Prato Feito, com a citação do então presidente Carlos Maciel nas investigações promovidas pela PF. Dessa forma, ele se afastou do cargo. Desde então, a organização adotou um tom mais duro com Mauá, sob gerência interina de Adriana Berringer Stephan, sob cobrança pública do passivo bilionário e ameaça de deixar os serviços ao término do aditamento.
Em seguida, o Nardini sofreu mudanças, com a demissão de cinco cargos administrativos, indicados por Atila. Único sobrevivente aos cortes, o superintendente Antonio Carlos Marques, aliado do socialista, pediu desligamento. Dessa forma, o hospital será obrigado a ter o seu quinto gestor, após 17 meses. Antes, passaram no posto Ricardo Carajeleascow, Renata Martello e Vanderley da Silva Paula.
Com o agravamento da crise, Alaíde se viu obrigada a entrar de cabeça nas negociações na condição de prefeita em exercício, poucos dias depois de mudar a sua rotina de dona de casa, quando era vice-prefeita. A emedebista segue no comando da cidade, mesmo com a liberdade de Atila concedida pelo ministro do STF (Supremo Tribunal Federal) Gilmar Mendes no último dia 15, por estar impedido de reassumir a chefia do Executivo devido à determinação do TRF-3 (Tribunal Regional Federal da 3ª Região).