O Brasil impõe limites à liberdade de expressão política e, por isso, viola direitos humanos. É a constatação de Daniela Bucci, autora do livro Direito Eleitoral e Liberdade de Expressão: Limites Materiais, que acaba de ser lançado pela editora Almedina Brasil.
Docente do curso de Direito da USCS (Universidade Municipal de São Caetano do Sul), Daniela focou no discurso político durante as campanhas eleitorais de 2012 e 2014 para produzir o material e verificou suas consequências. Muito mais que o comportamento do eleitor ou da imprensa, o que foi dito pelos próprios candidatos foi observado.
“A liberdade de expressão é parte do direito à informação. O que é falado permite que o eleitor analise melhor o ponto de vista de seu candidato”, disse Daniela, durante entrevista ao canal RDtv. A professora também é coordenadora do Observatório de Direitos Humanos da universidade.
Em seu trabalho para identificar conteúdo e limites impostos, a autoria comparou o trato dispensado a discursos e informações veiculados em períodos de campanha por tribunais eleitorais nacionais e internacionais. “Levantei temas classificados como importantes e busquei identificar os limites aceitáveis dentro de democracia pluralista, com base em dispositivos legais. Numa visão mais universalista, o Brasil viola direitos humanos ao impor limites
à liberdade de expressão política, em comparação com a forma com que as cortes europeias e interamericanas agem”, diz.
Daniela explica que ao contrário do Brasil, onde há muitas imposições, no âmbito internacional se permite mais que os agentes públicos, não necessariamente políticos, se expressem – mesmo sabendo que, assim como as celebridades, eles estão mais expostos (no que se refere a direito de imagem e privacidade). “Claro que há limites, mas entende-se que a liberdade de expressão é essencial para a democracia”, opinou. “A Itália, por exemplo, permitiu e depois coibiu o termo ‘mafioso’, ao exigir uma base de veracidade para quem fosse empregá-lo. Porém, em outros países nem mesmo acusações são censuradas”, comenta.
Segundo Daniela, a questão é a extensão do que é dito. “Poucos discursos são censurados hoje em dia pelas cortes internacionais, a não ser que causem danos, caso dos discursos de ódio ou que incitem a violência. Falar que um candidato é contra o programa Bolsa Família ou contra pobres pode trazer consequências negativas. Mas não pode falar? Que efeito emocional isso vai causar na cabeça do eleitor?”, questiona.
Fake news
Em ano eleitoral, com tamanha divisão política e a disseminação das fake news (não identificadas nas cortes pela autora), Daniela questiona se não seria o momento de deixar o entendimento para os eleitores e não para os tribunais. “Numa democracia é preciso que haja o equilíbrio. O problema é que o Brasil diverge pela falta de leis mais claras, o que permite interpretações diferentes e gera insegurança jurídica. Mas as cortes têm permitido que se fale mais. O melhor exercício para a democracia é deixar falar e, lógico, aplicar sanções, desde que também sejam proporcionais”, acrescenta.
Durante uma campanha eleitoral, determinadas informações são importantes e podem fazer a diferença no resultado. “Até para analisar os casos é preciso levar isso em conta. Uma coisa é conteúdo de interesse geral, outra é a vida íntima de um político. Mas alguns dados pessoais podem impactar na hora do voto e devem ser veiculados para uma escolha fundamentada. Qual a postura do candidato em determinadas situações? E sua vida pregressa? De repente, atropelou alguém e fugiu. Por que não mencionar isso? Já outras questões podem ficar guardadas em respeito ao direito a honra e a privacidade”, completa.