Pavilhão Vera Cruz é retomado pela Prefeitura de São Bernardo

Um ano e dez meses após o início da concessão do Pavilhão Vera Cruz para a Telem, a Prefeitura de São Bernardo anunciou nesta segunda-feira (03/04) a rescisão do contrato, transformando o local em espaço público. Além disso, o Poder Executivo também assumiu as aulas do CAV (Centro Áudio Visual). Agora, o prefeito Orlando Morando (PSDB) vai procurar empresas para fazer parcerias para retomar a ideia de transformar o local em polo cinematográfico.

“Desde o começo do ano fomos instruindo um processo pela qual a procuradoria apontou que a concessionária não cumpria o contrato, não dava as contrapartidas. No mês passado, eles anunciaram o desligamento dos professores do CAV. Demos prazo para que eles fizessem a defesa. Na sexta-feira (31/03), eles foram notificados e hoje eles deram o aceite, devolvendo o prédio, o que para nós fica claro que eles aceitaram a rescisão”, explicou Morando.

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O local será comandado por duas pastas diferentes. A área do acervo cultural do Vera Cruz com os figurinos, materiais usados nos filmes produzidos pela Companhia entre 1949 e 1954 e alguns maquinários ficaram nas mãos da Diretoria de Cultura, ligada à Secretaria de Educação. O Pavilhão onde acontecia alguns eventos ficará aos cuidados da Secretaria de Desenvolvimento Econômico.

Já o estacionamento do Pavilhão Vera Cruz, utilizado por alunos da Faculdade de Direito, será agora administrado pelo Rotativo São Bernardo, autarquia municipal, e será cobrado apenas pelo horário utilizado.

Futuro

Entre os próximos objetivos da Prefeitura estão a reabertura dos cursos do CAV, algo que deve acontecer a partir de maio, logo após a finalização do edital para chamar os professores. Orlando anunciou que uma auditoria vai verificar qual é o tamanho da dívida da Telem com o município.

Orlando Morando revelou que uma emissora de televisão procurou a Prefeitura e está semana fará uma visita para verificar o local. Caso este canal televisivo tenha interesse, o Executivo vai abrir um chamamento público para realizar uma parceria para administrar o local e realizar aquilo que estava no contrato com a Telem, ou seja, a revitalização do Pavilhão Vera Cruz e a retomada do polo cinematográfico.

Relembrando

Em fevereiro deste ano alguns shows como o de Gal Costa e Djavan foram marcados no local, porém foram impedidos após falta de alvará dos bombeiros e da ausência de documentos exigidos pelo Poder Executivo.

O caso “Vera Cruz” foi alvo de reportagem do jornal Repórter Diário. Confira:

Governo Orlando Morando não tem plano para o Vera Cruz

Por Bruno Coelho (24/03/2017)

De 1949 a 1954, a Companhia Cinematográfica Vera Cruz, em São Bernardo, entrou para a história do cinema brasileiro, com grandes produções da sétima arte. Seis décadas depois do resplendor, o local poderia ser um pilar cultural no ABC na produção audiovisual, não fosse o estado de abandono. As câmeras, luzes, cenários e atores deram lugar ao vazio, edificações inacabadas, entulhos, um ar de melancolia e um futuro sem garantia de que um dia o espaço ganhe vida novamente. Hoje, o Vera Cruz sofre de promessas não cumpridas do ex-prefeito Luiz Marinho (PT) e da total falta de perspectiva do sucessor Orlando Morando (PSDB), que sequer citou o equipamento no plano de governo na eleição municipal de 2016 e tampouco detalhou o que será feito no espaço durante a gestão, apesar dos questionamentos do Repórter Diário.

Na gestão petista, o projeto de revitalização do espaço de 45,6 mil m² foi anunciado com pompas, por meio da assinatura de concessão, em junho de 2015, do local por 30 anos com a empresa Telem SA (Técnica Eletro Mecânica), vencedora do processo licitatório. Sob tutela da empresa, o ambicioso projeto previa em até 180 dias, a partir da assinatura do contrato até o fim do quinto ano, a construção de sete estúdios nos dois galpões, onde seriam realizadas gravações para comerciais, programas de televisão e filmes.

Dentro desse prazo, estavam projetados um anfiteatro, um memorial, sala de cinema e restaurante e Núcleo de Formação Audiovisual. A construção de estacionamento, salas de produção, locadora de equipamento e um teatro também estavam no horizonte do Vera Cruz. O investimento previsto era de R$ 158,3 milhões, embora o capital seja de R$ 15 milhões da concessionária, conforme dados da Junta Comercial do Estado de São Paulo.

No entanto, nada do que foi alardeado pela gestão Marinho saiu do papel. O RD esteve nas instalações do Vera Cruz nesta terça-feira (21), quando havia apenas dois funcionários. Questionados sobre onde ficava o Núcleo de Formação Audiovisual, não souberam dizer, apenas responderam que não era situado no local.

Em vez de estúdios modernos, apenas o vazio imenso nos dois galpões. No lado de fora, entulhos e uma edificação que mais era um esqueleto de concreto, onde deveriam funcionar o cinema e o teatro, porém, hoje conta apenas piso de terra, paredes pichadas, lixo e colchões no chão, usados provavelmente como dormitório por moradores de rua. Já a plateia era formada morcegos e baratas nas salas escuras e vazias.

Sem cumprir o contrato de revitalização do Vera Cruz, a Telem realizava o Núcleo de Formação Audiovisual em um prédio anexo ao Cenforpe (Centro de Formação de Profissionais de Educação), estrutura pertencente à Secretaria de Educação, na via Anchieta. Como se não fosse o bastante, a gestão do curso é problemática, com atrasos de salários, cancelamentos de matrículas e outros descumprimentos contratuais.

Desde que assumiu o governo, Morando sinalizou o rompimento com a Telem. A medida visando o fim da parceria não demorou, veio no dia 15, após aval da Procuradoria-Geral de São Bernardo pela rescisão contratual. O Paço assegurou apenas que pretende incorporar o Vera Cruz ao Departamento de Cultura e retomar os cursos audiovisuais em até 60 dias a partir da rescisão com a Telem.

Para detalhar um possível projeto de reforma do Vera Cruz, o RD procurou Morando, porém, não obteve respostas da Prefeitura. Por sua vez, Marinho também foi contatado por meio de sua assessoria a fim de abordar o não cumprimento do acordo previsto na concessão e também não houve retorno. Já a Telem igualmente optou pelo silêncio.

Na espera por definição, aulas são suspensas

Devido à incerteza na permanência da Telem, as aulas dos três semestres do Núcleo de Formação Audiovisual estão suspensas desde o começo do ano, assim como o processo seletivo para novas matrículas. Essa é apenas uma das outras turbulências que o curso atravessa. Em maio de 2016, os professores e funcionários da terceirizada entraram em greve por conta do atraso de salários.

Aos 70 anos e morador de São Bernardo há quatro décadas, o aposentado Espedito Vicente tem desde a infância paixão pelo cinema, quando ainda residia em Garanhuns, no agreste pernambucano, ao ver o padre fazer projeções de imagens em uma caixa de papelão nas aulas de catecismo. “Terminei o curso no CAV em agosto (do ano passado). E de lá pra cá, o terceiro semestre foi o mais conturbado, por causa da Telem, por conta de atraso de pagamento de funcionários, professores e falta de manutenção e de equipamento. Foi difícil (completar o curso), mas terminei”, lembrou o aposentado.

Estudante do curso, Malu Maria Matos, 21 anos, está à espera do retorno das aulas. Apesar de elogiar a grade curricular do Núcleo de Formação Audiovisual, sobram reclamações à estrutura do local, além das frequentes paralisações das aulas. “Um dos problemas é o prédio atrás do Cenforpe, pois vaza (água) quando chove, há o Samu (Serviço de Atendimento Móvel de Urgência) embaixo e o restaurante-escola (no mesmo local). Mas o curso em si é ótimo”, defendeu.

Companhia foi marco na história do cinema brasileiro

O Vera Cruz foi a terceira companhia cinematográfica criada no Brasil, depois da Cinédia (1930, no Rio de Janeiro) e da Atlântida Cinematográfica (1941, também na capital fluminense). O equipamento em São Bernardo foi fundado por Franco Zampari e Ciccilo Matarazzo. Ambos tinham em mente produzir filmes mais rebuscados, assim investimento em infraestrutura moderna para época.

Durante o sonho da produção em pompas da sétima arte em São Bernardo, mais de 40 longas e curtas-metragens foram feitos no Vera Cruz. Entre as produções, estão O Cangaceiro (1953), dirigido por Lima, cuja obra foi premiada como melhor filme de aventura no Festival de Cannes. O local também hospedou o filme Sinhá Moça (1953), de Tom Payne e Osvaldo Sampaio, premiado em festivais como Veneza, Berlim e Havana.

Foi no Vera Cruz que o cineasta e humorista Amácio Mazzaropi deu seus primeiros passos no cinema, produzindo o seu primeiro filme, Sai da Frente (1952), onde produziria mais dois trabalhos.

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