Preço baixo e economia aquecida não alavancam motéis no ABC

Os 150 motéis da região empregam 7 mil profissionais / Foto: Marciel Peres

O setor de motéis na região não tem crescido na velocidade esperada pelos empresários do ramo, apesar do aquecimento da economia e da maior liberdade sexual nos últimos anos. O argumento é o maior leque de alternativas que hoje concorrem com os motéis, um deles a rede hoteleira. “Alguns clientes optam por utilizar hotéis no final de semana, porque acabam saindo mais barato”, explica o presidente do Sehal (Sindicato das Empresas de Hospedagem e Alimentação do Grande ABC), Wilson Bianchi.

O empresário aponta, ainda, outras questões, como mudanças de hábito dos jovens. “Ficou comum, hoje em dia, eles alugarem uma casa na praia no final de semana. Além disso, diminuiu a frequência daqueles clientes que saiam da balada e iam para o motel”, explica.

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O acesso à Internet também é apontado com um dos fatores que impactaram no desempenho dos motéis do ABC nos últimos anos, pois o consumidor consegue pesquisar grande número de opções de motéis com maior facilidade.

Pesquisa da Fundação Getúlio Vargas dá razão para quem tem a sensação de que o preço cobrado por alguns motéis está salgado. O levantamento da FGV, feito às vésperas do Dia dos Namorados, revelou que o reajuste dos preços cobrados por hotéis e motéis chegou a 12,68%, em média, num período de 12 meses – mais que o dobro da inflação oficial registrada no mesmo período, medida pelo IPCA (Índice de Preços ao Consumidor Amplo).

Defasagem
No entanto, na avaliação dos empresários do ABC estes números não refletem a realidade local. Em média, os motéis da região cobram R$ 80 pela permanência de 3 horas. Em São Paulo, o serviço custa R$ 120. Em alguns casos, os preços no ABC são 50% menores em comparação com estabelecimentos semelhantes da Capital.

Na opinião do presidente do Sehal, os valores estão muito defasados. “Os motéis da região precisam aumentar os preços para pelo menos repor a inflação, o que não tem acontecido. Os empresários precisam acabar com o medo de perder cliente, opina.

Para Bianchi, a principal consequência da defasagem é a queda da rentabilidade. Os motéis passam a ter mais dificuldade para realizar a manutenção do estabelecimento.
Os 150 motéis da região empregam média de 7 mil profissionais diretos, segundo o Sehal, entre gerentes, camareiros, cozinheiros, seguranças e faxineiros.

Os motéis não revelam o faturamento dos últimos anos. Estima-se, no entanto, que cada estabelecimento de pequeno porte lucre, em média, R$ 50 mil por mês. Os de médio porte faturem aproximadamente R$ 100 mil e os de grande porte acima de R$ 150 mil mensalmente.

De acordo com os empresários, não houve expansão significativa do serviço no ABC. “Na verdade, o tipo de empreendimento nunca teve oscilação muito grande”, explica o presidente da Associação Paulista de Motéis, Rafael Vasquez.

Alguns locais se destacam na região como pontos de maior concentração de motéis. É o caso da avenida dos Estados, em Santo André e Mauá, e também da avenida Maria Servidei Demarchi e Estrada Martim Afonso de Souza, em São Bernardo.

Suítes unem luxo e prazer

Entre os 150 motéis do ABC, há espaços para todos os gostos e bolsos. Até ambientes para deixar o casal nas nuvens. O Vyss, localizado no km 17,5 da via Anchieta, em São ernardo, ostenta uma suíte com 400 m², com 11 ambientes, com destaque para a cama de 6 m² e o telão de 100 polegadas. A suíte Vyss tem, ainda, uma piscina com 50 mil litros, além de sauna, hidro e colchão d’água. O requinte custa R$ 529 (período de 12 horas de segunda a quinta e oito horas de sexta a domingo). 

“Não temos suítes temáticas, pois optamos por motel com conceito mais limpo em decoração e conforto”, diz Maria Pinho, gerente-geral do Vyss. Para fidelizar clientes, o motel mantém cartão de fidelidade que dá desconto a partir de 15% para as suítes maiores, exceto feriados e Dia dos Namorados, data de maior procura.

O Le Moulin não fica atrás em luxo. A suíte Le Moulin faz jus ao nome. Tem 360 m², duas lareiras, piscina de 50 mil litros e um bar com pista de dança. O cliente paga R$ 520 pelo requinte (por 12 horas de segunda a quinta e seis horas de sexta a domingo). “Somos o motel com o maior número de suítes do ABC”, destaca Maurício Singer, um dos proprietários do LeMoulin, que conta com 77 suítes e fica no km 23 da Anchieta, também em São Bernardo.

Em Santo André, o Confidence, situado na avenida Giovanni Batista Pirelli, traz suítes ‘quentes’ até no nome. A Hawai tem piscina com frente transparente, cachoeira, teto solar, iluminação cenográfica, hidro dupla e outros confortos a serviço do prazer. A estadia sai por 199 (todos os dias, no período de quatro horas) ou R$ 299 (segunda a quinta no período de 12 horas). 

“Nosso cliente está cada vez mais exigente. Por isso, estamos sempre atentos às inovações, como piscina com fundo transparente”, diz uma Olga Silva, uma das sócias. “Aqui o cliente come, dorme e brinca”, completa. 

Mas para quem quer economizar e não dispensa requintes, os motéis do ABC oferecem suítes que custam, em média, R$ 50.  

Cozinha internacional

A gastronomia é outro ponto forte nos motéis. Alguns oferecem até culinária internacional, como Le Moulin, que tem no cardápio lagosta para ser degustada. O prato para o casal sai por R$ 170 e vem com molho bechamel (sal, pimenta e noz-moscada), acompanhado de arroz, purê e champignon. No Confidence, um dos pratos mais requisitados é à base de picanha. A carne, da Argentina, acompanhada de batatas e custa R$ 34,90. 

Repressão social marca segmento

Criado no início da década de 1920, nos Estados Unidos, com o objetivo de proporcionar estadia rápida a motoristas e viajantes rodoviários, no Brasil o motel deixou de ser hotel de beira de estrada e se transformou em local apenas para encontros reservados. Por este motivo, ainda é considerado por muitos como espaço proibido, ligado à traição e à promiscuidade. Com isso, o motel hoje é alvo de curiosidade e fantasias.  

Para o psicoterapeuta sexual Oswaldo Martins Rodrigues Junior, diretor do Instituto Paulista de Sexualidade, a modalidade moteleira gera conflitos sociais no País porque o sexo ainda é uma atividade difícil de ser tratada de forma aberta pela sociedade. “Ir ao motel significa que a pessoa irá praticar atividade sexual e dar indícios públicos de sua vida privada é algo muito complicado, difícil de vivenciar, produzindo comportamentos de esquiva. Assim, o motel, para estas pessoas, é sinal de perigo e que deve ser evitado”, diz. 

Ainda segundo o especialista, as regras sociais imperam quando o assunto é frequentar motel. “Usar um motel para fazer sexo também significa, em nossa cultura, que as pessoas envolvidas não têm legitimidade para a prática a qual se propõem. E não ter legitimidade implica não serem casadas, não terem reconhecimento social ideal para a prática do sexo”, completa.         

Para Carla Baylão de Carvalho, autora do trabalho Representação Social dos Motéis para os Brasileiros, realizado na Universidade de Brasília, com o passar do tempo e com a ideia de que a família e o lar são espaços onde a moral e os bons costumes devem imperar, o motel assumiu o papel do lugar adequado para encontros extraconjugais. “Ou como o local para a prática do sexo entre os jovens, uma vez que a casa continua sendo espaço de respeito”, diz Carla. 

Drive-in perde espaço, mas ganha no bolso
 
Alternativa econômica de namorar sem ser incomodado e quase e extinto no ABC por conta do alto número de motéis – 150 no total –, o drive-in é registrado, na maior parte das vezes, como casa de lanches, quando, na verdade, são estacionamentos privativos. 
 
Alguns enxergam a modalidade como alternativa para sair da rotina. Um fotógrafo de Santo André que preferiu não se identificar afirma que frequentava drive-in por acreditar que se tratava de um lugar diferente e com bom preço. Os pontos negativos, segundo ele, ficam por conta do conforto e da higiene. “Pagava, em média, de R$ 15 a R$ 20, sendo que em um deles tinha até banheiro com chuveiro”, conta. “Acredito que o drive-in acaba saindo mais em conta que um motel bacana”, defende.
 
Instalado no polo de motéis, na avenida dos Estados, em Santo André, o Auto Lanches Draivão está há mais de 30 anos no local e oferece aos clientes  box (garagens) com TV e canal erótico, além do cardápio que inclui lanches, pizzas, sorvetes, porções e bebidas. “A clientela caiu muito nesses anos, mas buscamos atrair o público com novas ações, como entregar folders com camisinha em bares e baladas”, explica o gerente Nelson Antônio Aparecido. Quem utiliza o local paga, no máximo, R$ 19 e fica o tempo que quiser.
 
Com a mesma média de preço, o Corujão, também em Santo André, tenta sobreviver com inovações, como ducha na vaga. Denis Silva, proprietário da casa, diz que o negócio não é mais tão viável como antigamente devido aos baixos preços dos motéis. Só mantém o negócio porque o terreno é próprio. Silva acredita que o drive continua sendo boa opção para universitários, que saem das aulas e vão até o local em busca de diversão rápida. “Muitos clientes também são aqueles homens que estão acompanhados por garotas de programa e querem gastar pouco”, completa. 
 
Popularizados no Brasil na década de 1970, os drive-ins eram um tipo de cinema ao ar livre frequentado por casais de namorados. Porém, o aumento da violência obrigou o consumidor a buscar ambientes mais privativos e seguros e, assim, dar preferência ao motel. Em setembro de 2006 um arrastão num drive-in do bairro Sacomã, em São Paulo, causou a morte de uma pessoa. 
 
Direitos
De acordo com a diretora do Procon de Santo André, Ana Paula Satcheki, como qualquer outra forma de prestação de serviço, os drive-ins devem responder por problemas como falta de segurança ou de higiene. Entretanto, os consumidores não costumam registrar reclamações. “Não é comum o tipo de reclamação, porque é preciso se expor”, afirma a diretora.  
 
(Esta matéria especial teve a participação de Aline Bosio, Carolina Neves, Larissa Marçal, Leandro Amaral e Tiago Oliveira)

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