Lei Cidade Limpa se arrasta no ABC

Santo André ainda engatinha quando o assunto é o debate do projeto de lei (Foto: Marciel Peres)

Inspirado no projeto de lei regulamentado número 47.950/06, em São Paulo, o ABC iniciou a discussão para reduzir a poluição visual decorrente de publicidade externa, como outdoors e painéis em fachada de prédios. Atualmente, a Lei Cidade Limpa é realidade somente em São Caetano e Ribeirão Pires.

Nas duas maiores cidades da região – Santo André e São Bernardo – o tema ainda é uma incógnita. Na primeira, o assunto ainda está em estudo. A Prefeitura deu vários prazos para encaminhar o projeto à Câmara, mas foram prorrogados. “O prefeito nos orientou para a elaboração de um projeto que não ofereça riscos aos pedestres, moradores e motoristas”, adiantou o secretário de Comunicação, Alexssander Soares.

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A expectativa é que a medida seja mais branda do que a implantada em São Paulo e São Caetano. A ideia não é proibir, mas regulamentar a propaganda. A iniciativa, elaborada por meio das secretarias de Comunicação, Habitação e Gabinete, está recebendo a formatação burocrática, com a roupagem de itens técnicos e padronizados.

O escopo do projeto em Santo André prevê o fim dos abusos. Na prática, a matéria encaminhada ao Legislativo não designará especificações e nem sanções, as quais serão deliberadas no plenário.

IPTU

Segundo apuração da reportagem, em terrenos privados deverão ser permitidos apenas dois outdoors. Se a área não for edificada, a exploração publicitária só será permitida se o IPTU (Imposto Territorial e Predial Urbano) estiver em dia e o interessado se responsabilizar pela manutenção da calçada e do terreno. Desde agosto de 2010, a Praça de Atendimento da Prefeitura não autoriza a inscrição de novas publicidades até que a nova lei seja sancionada.

Em São Bernardo, o tema ganhou vida recentemente. Intitulada localmente como Lei dos Anúncios, a iniciativa está em fase de discussão com alguns segmentos e instituições, como a Acisbec (Associação Comercial e Industrial de São Bernardo). Por estar em fase embrionária, a Prefeitura não revelou quais itens deverão elencar o projeto. A assessoria de imprensa do Paço informa que a iniciativa será encaminhada à Câmara na primeira quinzena do mês de setembro.

Lei vigora só em dois municípios

São Caetano foi o primeiro município do ABC a adotar a Lei Cidade Limpa (nº 4.831, de 2009). Balbo Santarelli, secretário de Controle Urbano, considera que a aplicabilidade da medida está na casa de 80%. A ação, que determina padronização da publicidade e, com isso, limpeza visual do município, serviu de exemplo para Ribeirão Pires, onde a legislação vigora desde março deste ano.

Até agora foram aplicadas 257 multas em São Caetano, 5% de estabelecimentos autuados mais de uma vez. A primeira infração custa R$ 5 mil mais R$ 500 por metro em cada ponto colocado. “Precisamos manter o padrão já alcançado e fiscalizar alguns estabelecimentos que retiraram a fachada e deixaram a estrutura ou que passaram por troca de proprietário”, comenta Santarelli.

Em Ribeirão Pires, os comerciantes têm até 30 de setembro para adequar os anúncios indicativos dos estabelecimentos comerciais à lei Cidade Limpa (nº 5.509). Os imóveis com testada de até 9,99 metros poderão ter anúncio de no máximo 2 m², entre 10 e 99,99 metros receberão anúncio de até 4m² e os maiores que 100 metros terão dois anúncios de até 10m² com distância de pelo menos 40 metros entre si. As adequações em relação aos anúncios publicitários, como muros e outdoors, foram feitas até 30 de junho.

Adesão
Marcelo Menato, secretário de Desenvolvimento Econômico, Emprego e Renda de Ribeirão, acredita que pelo menos metade dos estabelecimentos já estão dentro da lei. “Poucos deixaram para última hora, até porque depois do prazo poderão ser notificados e multados”, diz. A primeira multa custa R$ 3,5 mil com acréscimo de R$ 500 para cada metro quadrado que exceder o limite de 4m². Já na segunda infração será cobrado o dobro do valor.

Para Menato, é fundamental que Ribeirão Pires, estância turística, seja limpa e siga o exemplo de São Paulo e São Caetano. Como incentivo, o Banco do Povo Paulista oferece empréstimos de R$ 200 a R$ 7,5 mil com até 36 meses para pagar, e taxa de juros 0,7% ao mês. Quem optar por cadastrar anúncios pela Internet (www.ribeiraopires.sp.gov.br/cidadelimpa) tem desconto de 10% no IPTU (Imposto Predial e Territorial Urbano) de 2012.

Opinião

Márcia Salles, gerente da Renstler, da loja de vestuário em Ribeirão Pires, acredita que há problemas mais importantes para serem resolvidos, como alto número de moradores de rua, incidência de drogas e muitos cachorros na rua do Comércio. “Tivemos de tirar nossas araras de roupas da frente da loja, o que atraia muitos consumidores e vamos trocar a fachada ainda”, conta.

Marcio Lopes Gomes, gerente do açougue X-Boi, é a favor da nova lei, apesar de já ter feito alterações e necessitar mudar a fachada do estabelecimento. “Claro que a gente acaba perdendo, porque tivemos que tirar as faixas e vamos trocar a fachada nas próximas semanas, o que gera custo, mas sabemos que é para um bem comum”, diz.

Especialista pede rigor para conter excessos

Apesar de causar polêmica, como em São Paulo, em 2007, a Lei Cidade Limpa é uma tendências nos grandes centros urbanos, mas que precisa de medidas rígidas para que a comunicação visual fique organizada. “As grandes cidades já começaram a pensar nisso, pelo bem do comércio e pelo futuro da publicidade”, justifica Kléber Carrilho, professor de Publicidade e Propaganda da Universidade Metodista de São Paulo, ao lembrar que na Capital havia superexposição de material publicitário, o que poluia visualmente a cidade e causava confusão de informações.

Segundo o professor, enquanto São Paulo precisou adotar medidas drásticas, ao proibir e multar quem desrespeitar as normas impostas, outras cidades do mundo adotaram ações mais brandas. “O que aconteceu em São Paulo é um exemplo para os demais municípios onde há grande quantidade de propaganda. A diferença com cidades, como Nova York, Tokio, Paris e Roma, é que lá a regulamentação não foi tão drástica e, além disso, algumas vias importantes, como a Time Square, possuem medidas diferenciadas, pois têm como características aqueles luminosos”, explica.

Para o especialista, assim como ocorreu na Capital, no ABC as medidas também deverão ser mais rigorosas, pois a região sofre do mesmo mal que São Paulo antes da lei. “É preciso, primeiramente, algo mais rígido para que os resultados comecem a aparecer”, destaca.  

Saúde

Apesar de não afetar diretamente a saúde física humana, a poluição visual pode contribuir para alguns males. “Sempre lutamos contra todo tipo de poluição. Sendo assim, a poluição visual também deve ser combatida, pois confunde as pessoas com o excesso de mensagens”, lembra o professor de Publicidade e Propaganda. Entre os pontos negativos do excesso de faixas e outdoors está a distração do motorista, que pode causar acidente por desviar o foco de atenção.

Região falha na fiscalização

A proibição da publicidade em mídias exteriores causou na cidade de São Paulo a demissão de mais de 20 mil pessoas e um prejuízo de mais de R$ 200 milhões, segundo dados do SEPEX-SP (Sindicato das Empresas de Publicidade Exterior do Estado de São Paulo). No ABC, além de histórico falho em fiscalização, a Lei Cidade Limpa foi imposta de forma não democrática em São Caetano.

Uma das maiores empresas de outdoor, frontlight e busdoor da região, a Amplo Vision perdeu cerca de 10% em verba, além de seis demissões. De acordo com o gerente de operações da empresa, Luís de Lima Cena, a tensão agora fica por parte de São Bernardo. “Apresentamos proposta que prevê a retirada de parte das mídias das principais avenidas, como Lions, Faria Lima e Marechal Deodoro. Desde modo o impacto seria menos negativo”, afirma Cena.

Segundo o presidente do SEPEX, Luiz Rodovalho, o melhor caminho para que todas as questões sejam solucionadas de forma pensada e democrática é a discussão e planejamento que contemple a integração da mídia exterior. “E é isso que estamos fazendo também em São Bernardo, desenvolvendo estudos técnicos para auxiliar o poder público”, afirma.

Para a diretora da Eletromídia ABC, Cirlene Rabecchini, a regulamentação é necessária e a fiscalização também. Mas a extinção das mídias é perda significativa tanto para as empresas como para a cidade. “As pessoas precisam entender que esse tema é extremamente amplo e precisa ser discutido com cuidado. Poluição visual vai muito além da propaganda e as cidades precisam de uma comunicação bem feita e isso não se faz apenas com um meio de comunicação”, defende.

Silene explica que o processo não foi nem um pouco democrático em São Caetano e a ineficiência da fiscalização na região fez com que ano passado ocorresse a invasão de inúmeras placas sem licença de instalação. “Antes de retirar totalmente as mídias, é necessário investir em fiscalização”, recomenda.

O que não pode

Outdoors (Ribeirão Pires e São Caetano)

Placas, faixas ou cartazes (Ribeirão Pires e São Caetano)

Adesivos publicitários (Ribeirão Pires e São Caetano)

Pinturas em muros ou laterais de prédios (Ribeirão Pires e São Caetano)

Distribuição de panfletos (São Caetano)

Utilização de som ou abordagem das pessoas para propaganda (São Caetano)

Fala Povo

“Ninguém vai gostar, inclusive eu que trabalho com publicidade. Até defendo que os banners em rodovias sejam extintos, mas nas cidades não” – Neuza Ferraz, corretora de saúde, Santo André.

“Acho muito legal a iniciativa, pois já temos a poluição sonora, a do ar e também a visual. Seria bom reduzir pelo menos uma” – Neusa Oliveira, corretora de linha telefônica, Santo André.

“Não sei exatamente quanto a nova lei pode custar ao comércio, mas deve prejudicar muito o empresário, já que a propaganda é a alma do negócio” – Edinária Soares, vendedora, Santo André.

“As pessoas ficam sem saber quais serviços oferecemos. As vendas cairão. A limpeza das fachadas vai facilitar a vida dos pichadores” – Amanda Ferreira, gerente de ótica,  Ribeirão Pires.

“As fachadas irão ficar mais limpas, mas para falar a verdade quase ninguém presta atenção nas placas” – Pedro Francisco Barreiro, aposentado, São Bernardo.

“A cidade ficará mais limpa ,pois tem muita poluição visual. Tem alguns lugares que não dá pra distinguir direito as informações” – Débora Pereira, auxiliar de escritório, Diadema.

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