“Foi aos 12 anos. Ele era amigo da família. Não tive tempo de reagir. Foi uma eternidade. Não sei o que passou pela minha cabeça. Só pensava que a culpa era minha”. O relato de M.A.P, moradora de Diadema, é um dos muitos casos de estupro que acontecem no Brasil. Na região, segundo números da Secretaria Estadual de Segurança Pública, uma mulher é estuprada por dia. Mas o número é muito maior, pois a maioria das vítimas sequer conta para os familiares sobre o ocorrido.
“Foram muitos anos pensando que a culpa era minha. Era uma tortura. Demorei mais de cinco anos para contar para os meus pais e saber trabalhar isso da melhor forma possível. Eu não tinha idade para entender aquela crueldade que fizeram comigo. Me sentia incapaz, pois mesmo gritando para que aquilo não acontecesse, ele simplesmente não parava. Eu chorava e chorava, apenas isso”, relatou M.A.P.
O que poucos entendem, é que os abusos não contam somente com a efetivação do ato sexual, mas com atitudes que podem causar traumas, como foi o caso de Y.L.S. “Eu era uma criança, só queria brincar. A inocência não me fez perceber o que aquele homem, que se dizia da família poderia fazer comigo. A mão dele deslizava pelo meu corpo. Ele tocava as minhas partes íntimas, era horrível”, relata a moradora de São Bernardo, que na época morava no Paraná.
Y.L.S. só buscou tratamento na fase adulta, quando soube que amigas também tinham sido vítimas. O trauma ainda faz com que a jovem esteja sempre em alerta, principalmente no transporte público. “Muitos homens acham que quando estamos em pé, no corredor do ônibus, eles podem ‘encoxar’, passar a mão e fingir que foi sem querer. Infelizmente isso acontece com muitas mulheres todos os dias”, afirmou.
Tratamento psicológico
Questionada sobre os motivos que levam a vítima de estupro se culpar, a psicóloga Cristina Pires considera que o fato tem relação direta com a cultura do tipo de violência. “Existe uma pressa em julgar, em achar uma culpa, e a vítima acaba colocando em si, mas claro que não é isso. As pessoas, os familiares querem dar algum sentido, mas responsabilizam a pessoa errada. Muitos perguntam sobre o motivo da falta de reação, mas como uma pessoa pode reagir se muitas vezes quem comete o tipo de crime está armado ou é mais forte?”, indaga.
Cristina afirma que existem vários tipos de praticantes, como predadores, pedófilos e abusadores. “Mas a principal causa é a falta de punição, pois eles cometem o crime e sabem que não serão punidos. O número de casos aumenta a cada dia, pois muitas vezes não existe a denúncia ou ela é mudada. Em estupro seguido de homicídio, o crime registrado é o de homicídio e não de estupro”, reclama.