Primeiro Cinetério tem fila de mais de mil pessoas

Já passava de meia-noite e meia, de sábado para domingo 14, quando o primeiro filme da sessão Cinetério estava prestes a terminar. Do lado de dentro do Cemitério da Consolação, pouco mais de 200 pessoas assistiram à projeção de As Sete Vampiras (1986), de Ivan Cardoso, enquanto mais de mil pessoas ainda faziam fila do lado de fora para ver a segunda sessão do evento, que transformou um dos cemitérios mais tradicionais da cidade em sala de cinema.

“Chegamos às 21h30, mas achamos que não ia ter tanta gente e fomos dar uma volta. Quando retornamos, a fila estava dando a volta no quarteirão”, contou Ana Lúcia Carjerani, de São Mateus, a primeira da segunda leva de espectadores da noite, que assistiria a Excitação (1977), de Jean Garrett, e a Ninfas Diabólicas (1978), de John Doo.

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Ana Lúcia, de 48 anos, saiu de sua casa, na zona leste, para acompanhar a filha Tatiana Carjerani, de 29, técnica em informática e “apaixonada por cemitérios”, mas acabou gostando do programa. “Acho ótima a ideia de passar filmes de terror em um lugar tão especial”, disse ela. “Achei que a sessão ia ser em uma capela. Quando soube que ia ser no corredor, entre os túmulos, achei mais bacana ainda. Cemitérios são lugares muito interessantes e merecem ser mais visitados”, contou Tatiana.

Uma dupla de seguranças que controlava a entrada do público no espaço comentava sobre o sucesso do evento. “Nunca vi tanta gente para gostar de cemitério. Às quatro da tarde de sábado, já tinha gente chegando. Se ganhar na loteria, vou abrir um cemitério só para passar filmes e ficar mais rica ainda”, gracejou a segurança. “Mandei minha mulher vender cachorro-quente aqui na frente hoje, mas ela não quis. Ia ter faturado”, rebateu o colega.

De volta ao lado de dentro, enquanto o cineasta Toninho do Diabo tirava fotos com fãs, a primeira sessão da noite terminava e o público era conduzido por monitores até a saída dos fundos da necrópole. O passeio em meio aos túmulos foi o gran finale de uma noite que promete se repetir mais vezes na Consolação. “É fantástico ver que, em São Paulo, em meio a suas tantas tribos, tem quem adorou nossa ideia. Isso nos faz querer pôr em prática o plano de fazer uma iluminação especial para montar trajetos culturais noturnos aqui”, informou Lúcia Salles França Pinto, superintendente do Serviço Funerário Municipal, que organizou o evento em parceria com a Secretaria Municipal de Cultura e a Cinemateca Brasileira. “Este é um verdadeiro museu a céu aberto, pois tem tantas personalidades aqui enterradas. É um espaço de memória e, portanto, de muita vida. É preciso ocupar espaços como este.” Ela diz que ações como a Cinetério trazem atenção para as melhorias necessárias das necrópoles da cidade. “Queremos criar a Associação Amigos da Consolação, para resgatar cada vez mais o local.”

Para quem temia pela segurança e preservação dos túmulos, vale citar que grades e seguranças impediam o acesso aos corredores laterais do local. Salvo os puladores de muro habituais, que também foram impedidos de praticar o esporte pela segurança, o público respeitou as regras. “Isso é tudo que as almas queriam. Os antigos cineastas, os artistas. De forma alguma é um desrespeito com os mortos. Isso é uma homenagem. Vejo as almas aplaudindo neste momento”, declarou Toninho do Diabo.

A próxima sessão Cinetério deve ocorrer no Cemitério Campo Grande, na zona sul, onde está enterrado o corpo do operário Santo Dias, líder da luta operária e morto pela Polícia Militar em frente à fábrica Sylvania, em Santo Amaro, em 30 de outubro de 1979. A história de Santo Dias inspirou Eles Não Usam Black-Tie, de Leon Hirszman, longa que será exibido na noite.

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